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Francisco Leite Duarte é Advogado tributarista, Auditor-fiscal da Receita Federal (aposentado), Professor de Direito Tributário e Administrativo na Universidade Estadual da Paraíba, Mestre em Direito econômico, Doutor em direitos humanos e desenvolvimento e Escritor. Foi Prêmio estadual de educação fiscal ( 2019) e Prêmio Nacional de educação fiscal em 2016 e 2019. Tem várias publicações no Direito Tributário, com destaque para o seu Direito Tributário: Teoria e prática (Revista dos tribunais, já na 4 edição). Na Literatura publicou dois romances “A vovó é louca” e “O Pequeno Davi”. Publicou, igualmente, uma coletânea de contos chamada “Crimes de agosto”, um livro de memórias ( “Os longos olhos da espera”), e dois livros de crônicas: “Nos tempos do capitão” …

50 anos do CCJS/UFCG – Sousa

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publicado em 21/05/2021 às 07h23

(Homenagem ao Centro e à Professora Lourdinha Rodrigues)

O Centro de Ciências Jurídicas e Sociais da Universidade Federal de Campina Grande, antiga Faculdade de Direito de Sousa (FDS), celebra, neste mês de maio, 50 anos. Uma história de sucesso, de resistência e de amor. Foi ali, no ano de 1986, que concluí o curso de Ciências Jurídicas e Sociais (Direito) e onde conheci muitos dos meus diletos amigos e amigas, inclusive a minha esposa, Dra. Francisca Lopes Leite.
Um bornal cheinho de saudades eu carrego: da faculdade, dos seus professores, dos servidores e dos colegas de curso. Ainda que as minhas condições não fossem das melhores naqueles anos, não posso negar: como fui feliz ali! Ainda hoje sinto o cheiro da faculdade, dos seus corredores, das suas salas, da biblioteca, da cantina de Dona Munda, do restaurante universitário, uma briga constante para mantê-lo em funcionamento. A comida não era das melhores, mas, para mim, que viera de Uiraúna com uma fome descomunal de aprendizagem, aquela sopa morna de feijão com pão francês à tardinha era um manjar dos céus.
Uma vontade enorme de nominar, para homenageá-las, muitas das pessoas com quem mantive contato na saudosa faculdade, mas é melhor evitar, afinal, muitas injustiças já foram cometidas por força do esquecimento que descura exatamente aquelas pessoas que jamais poderiam deixar de serem lembradas.
Concentro-me, pois, em um fato, em uma só pessoa: uma professora. Em nome dela, eu estendo o meu agradecimento a todos os demais professores, servidores e alunos antigos e atuais. Trata-se da Professora Maria Rodrigueis da Silva (Professora Lourdinha).
Eu concluíra, em 1978, o primeiro grau em Uiraúna. Como naquela cidade não havia estabelecimento de ensino do segundo grau, voltei para a zona rural onde residia com meus pais. Durante todo o primeiro semestre de 1979, trabalhei na “emergência” (frentes de trabalho), economizando o dinheiro para alugar uma casa na cidade de Sousa, onde pretendia continuar os meus estudos. Em julho de 1979, alugamos, eu minha irmã Flaviana, uma casa no bairro da Estação, nas beiradas gulosas do Rio do Peixe, que, de vez em quando, estendia sua bocarra em direção à calçada da nossa casa (conto isso no meu livro “Os longos olhos da espera”, 2020, Lura Editora).
Em 1980, entrei no Colégio Estadual Mestre Júlio Sarmento, onde tive como professora de História (acho que foi de História) a Professora Lourdinha. Em 1982, concluí o segundo grau, fui aprovado no vestibular para Direito, para iniciar a graduação no primeiro semestre de 1983.
Naquela época, eu acabara de deixar o emprego na farmácia de João Fernandes e conseguira uma colocação experimental em um estabelecimento atacadista de gêneros alimentícios, no bairro da Estação. Dado esse trabalho, era-me impossível estudar durante o dia. Ocorre que o funcionamento do curso no horário noturno da faculdade encontrava-se seriamente ameaçado, não lembro exatamente por qual motivo.
O meu coraçãozinho ficou do tamanho de uma cabeça de alfinete, palpitando, palpitando. Caso o curso não funcionasse à noite, todo o meu esforço cairia por terra, e minha frustração se prostraria em um tremendo sofrimento, logo eu que pusera os estudos como prioridade na existência.
“Como a vida não é ponto, mas uma reticência” (frase da personagem do meu romance “A vovó é louca”, 2020, Editora Transversal), eis que, em uma tarde capionga do mês de janeiro, o telefone tocou. Era a professora Lourdinha Rodrigues. Ela deixara o Colégio Polivalente, fora aprovada para professora na Faculdade de Direito e me oferecia um estágio a ser desenvolvido na Caixa Econômica Federal (CEF), na carteira de crédito educativo em conúbio com a faculdade.
Um milagre! Tudo resolvido e muito bem resolvido! Eu que ganhava um quarto de um salário-mínimo por dois expedientes de trabalho no armazém atacadista, agora, estagiaria na CEF apenas um expediente, ganhando um salário-mínimo. E bem melhor do que isso: à tarde, no meu primeiro dia de aulas da graduação, entrei na Faculdade de Direito de Sousa como a pessoa mais feliz do mundo.
A professora Lurdinha Rodrigues! Verdade que ela fora minha professora do segundo grau e conhecia meu desempenho escolar, mas vejam bem: eu era um garoto matuto, tímido, arredio às relações sociais, um forasteiro. Ela poderia muito bem – e este era o costume de então – ter indicado para a vaga de estagiário alguém da família dela, algum filho de conhecido seu, mas não. Sem eu ter pedido nada a ela, mesmo porque nem sabia dessas coisas chamadas estágios, ela, dentro da sensibilidade que marca a maestria de lecionar, vira as minhas agruras e, com elas, solidarizou-se.
Um ano após, findo o estágio na Caixa Econômica Federal, aos 23 anos, eu era servidor público federal concursado, tinha asas já potentes e ambiciosas, um horizonte aberto às possibilidades, um sonho desabrochando pela liberdade e, doravante, à espera de um dia agradecer.
Esse tempo chegou: muito obrigado, Professora Lourdinha Rodrigues! Muito obrigado, Faculdade de Direito de Sousa (CCJS/UFCG)! O meu presente tem em si plantadas as raízes da responsabilidade e humanidade da escola pública e de uma professora dos seus quadros.

Francisco Leite Duarte
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