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Jornalista. Ex-repórter do Portal MaisPB e de outros sites de João Pessoa-PB. Pessoense residente em São Paulo. Observadora da vida, gosta de contar histórias em primeira pessoa. Contato: [email protected]

Primeira despedida

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publicado em 18/06/2020 às 14h18
atualizado em 18/06/2020 às 13h19

Despedidas não são fáceis, nunca foram e nunca serão. Deixar partir quem se ama é abrir um vazio em você mesmo e no outro, sentimento que só será preenchido com o reencontro, e, talvez não. Quem fica sofre, quem vai também.

Lembro-me da primeira despedida. Como esquecer? Eu tinha 10 anos e foi registrada no Aeroporto Presidente Castro Pinto de João Pessoa (que na verdade é de Bayeux ou de Santa Rita, não sei). A primeira despedida marcou, as demais também.

Eu não sabia o que estava sobrevindo, mas minha mãe tentou me explicar: “Vamos ter que viajar, eu e sua irmã. Ela está doente”. Eu não compreendia, nem sabia por que minha mãe e minha tia choravam no sofá da sala após receber o diagnóstico da minha irmã. “O que está acontecendo?”, pensei, mas logo voltei a brincar e esqueci. Não demorou muito para ser lembrada.

Minha irmã estava doente. Parecia ser grave. Resolveram tratá-la em São Paulo. Talvez muito grave. Eu não entendi. Mas fui lembrada.

O dia foi quase um evento. A família marcou presença e mesmo todos afirmando que seria o melhor, a maioria chorava. Minha irmã era a única que sorria. Eu não entendia e ela também não.

Naquele dia houve um espetáculo gratuito, o que era comum em aeroportos pequenos há 20 anos. O show era estrelado pelos aviões, um por vez. Quando a aeronave levantava voo as pessoas saiam de um lado para outro em busca de vê-lo partir. Alguns aplaudiam. Alguns partiam nele. Alguns se partiam após sua partida. Era meu caso.

Chegada a hora. A despedida. A separação era iminente e sem data de retorno. Tudo era incerto e eu não entendia. Meus pais tentavam ser fortes, mas lamentavam e eu também.

A caminho do avião de mãos dadas com a minha mãe, minha irmã acenava e ria. Eu chorava. Queria estar lá. Queria ser minha irmã. Questionava-me por que não era eu quem estava doente, por que eu não era tão especial quanto ela. Naquele dia eu não entendi, hoje também não.

No dia da primeira despedida eu fiz parte do show. O avião decolou e eu corri para assisti-lo ganhar o céu. Eu me agarrei no parapeito do aeroporto, o que me impediu de partir junto. Meu pai tentava me consolar. Os que estavam ao redor não entendiam e eu também não.

Devo ter sido a criança mais apegada à mãe do mundo. Eu era excessivamente tímida e medrosa. A despedida da minha mãe e da minha irmã foi também a despedida daquela menina totalmente dependente. Mas eu ainda não sabia (nem entendia).

A compreensão demorou muito a chegar. Apenas uns três anos após a primeira despedida eu descobri que minha irmã tinha câncer. E foi ela que me contou. Na verdade, ela contava a uma prima nossa, que ficou despedaçada com a revelação. Eu também fiquei, mas fingi já saber. Eu não entendia porque ainda não sabia e demorei muito para entender.

Com 10 anos eu não entendia muita coisa, quase nada. Entretanto, rapidamente, de tanto vivê-la, eu aprendi que a despedida é, antes de tudo, a esperança de ser apenas um até logo e jamais um adeus.
Permiti-me guardar uma leve lembrança boa daquela despedida, afinal, foi a primeira, e diferente da última – após alguns meses de saudade – o reencontro aconteceu.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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