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Pandemia e crise econômica ampliaram crimes contra a infância na Paraíba

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publicado em 02/11/2021 às 11h59
atualizado em 02/11/2021 às 14h18
Foto: Luiz Marques/Unicef

O último relatório do Unicef, divulgado este mês, mostrou que entre 2016 e 2020, 35 mil crianças e adolescentes de 0 a 19 anos foram mortos de forma violenta no Brasil, além disso, 180 mil sofreram violência sexual. Os dados assustadores expõem o caos social a que os jovens estão submetidos no país. Apenas em João Pessoa, há pelo menos 150 ocorrências contra menores registradas neste período de pandemia de Covid-19, de acordo com a Delegacia de Crimes Contra a Infância e Juventude.

Segundo a titular da Delegacia, Joana D’Arc Sampaio, os números são ainda maiores. “Estes são os casos que estão registrados no livro de ocorrências, mas há muitos outros em andamento”, explica. São abusos, maus tratos, abandonos, mas, a maioria trata de violência sexual e, em boa parte dos casos, o agressor é alguém conhecido da criança. Um exemplo, foi o fato ocorrido no bairro do Cristo, no mês de setembro, no qual o tio foi acusado de abusar da sobrinha de 5 anos.

Há também muitos casos cometidos por parte de padrastos, mas isso não exclui que ela (a criança) venha a sofrer violência por outros tipos de parentes e de pessoas próximas à família e que tenha acesso à casa das vítimas. (Joana D’Arc)

Essa também é a constatação do relatório do Unicef, intitulado Panorama da Violência Letal e Sexual contra Crianças e Adolescentes no Brasil, elaborado em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), com uma análise inédita dos boletins de ocorrência das 27 unidades da Federação, o que inclui a Paraíba. Segundo o documento, o que chama a atenção na pesquisa é a ampliação da faixa etária atingida. Nos últimos quatro anos, foram violentadas no Brasil mais de 22 mil crianças de 0 a 4 anos.

Fonte: Unicef

“Os casos têm atingindo o público infanto-juvenil justamente pela própria característica de ser um público ainda em desenvolvimento e com pouca ou quase nenhum possibilidade de defesa”, destaca o juiz da Infância e da Juventude de João Pessoa, Adhailton Lacet. O juiz comenta ainda uma situação também percebida pela Delegacia de Crimes Contra a Infância e Juventude, de que caíram as denúncias de violência na pandemia já que as crianças passaram a ficar mais tempo em casa “sem poder dividir ou confidenciar os abusos com ninguém”, conforme avalia delegada Joana D’Arc.

A pandemia trouxe uma situação atípica, sobretudo, no cenário de violações dos direitos de crianças e adolescentes justamente por estes passarem mais tempo em casa e ali ocorrem às vezes agressões e violações de direito, por desequilíbrio dos pais ou responsáveis. (Adhailton Lacet)

O juiz da infância destacou que a crise econômica ampliou os riscos aos mais jovens por conta do desequilíbrio familiar. “Em algumas situações os pais estão desempregados, sem condições de garantir a subsistência de seus filhos. Uns enveredam para o consumo de drogas ou bebidas alcoólicas, o que fez com que as crianças fossem alvo fácil da ira e da irritabilidade. Há uma grande preocupação com a questão da subnotificação, ou seja, os casos que não são denunciados”, reforça.

Juiz Adhailton Lacet, da 1ª Vara da Infância e Juventude Comarca de João Pessoa / Foto: TJPB

Para o juiz, é possível dizer que as crianças de adolescentes que sofrem violações de direito ou abusos são, normalmente, oriundas de camadas menos favorecidas. Não necessariamente de pobreza absoluta, mas que vivem em condições que poderiam ter uma melhor qualidade de vida material. “É preciso que se tenha um apoio, um trabalho em rede, uma articulação bem dirigida por todos que fazem parte do sistema de garantia e defesa dos direitos da criança e do adolescente”, avalia.

Acolhimento salva crianças do ciclo de violência

Somente na comarca de João Pessoa, nas nove instituições de acolhimento disponíveis há 92 crianças e adolescentes sob medidas protetivas. Essas crianças sofreram algum tipo de violação, por isso, foram retiradas do ambiente da família natural e estão em acolhimento. Contudo, esse período é transitório, até que a reintegração da criança seja realizada para a própria família de origem, para uma família ampliada (seus parentes, tios irmãos), ou, em última hipótese, para uma família substituta através de um processo de adoção. “Nesse processo, como acontece no Brasil, sempre temos um maior número de pretendentes e um menor número de crianças de adolescentes disponíveis para a adoção”, pondera o juiz Adhailton Lacet.

Neste mês, o Governo do Estado lançou outro projeto que visa retirar as crianças da exposição à violência. O Serviço Regionalizado de Família Acolhedora na Paraíba é uma modalidade de abrigamento de crianças e adolescentes que já é oferecido em João Pessoa e em outros municípios do estado. “O que se fez agora foi capacitar famílias para atender de forma regionalizada esses acolhimentos”, afirma o titular da 1ª Vara da Infância e Juventude da Capital. Um município que não tem o projeto pode solicitar ao governo que acolha uma ou outra criança que esteja sofrendo violações. Para isso, a família é capacitada e vai receber um salário mínimo para cobrir as despesas.

Um Termo de Cooperação Técnica entre o Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Humano (Sedh), foi assinado com 47 municípios paraibanos de pequeno porte. O serviço é uma medida protetiva, temporária e excepcional, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que visa o acolhimento de crianças e adolescentes em situação de risco em residências de famílias previamente habilitadas e credenciadas. A seleção das famílias acolhedoras será feita mediante edital de chamamento. O período do acolhimento poderá ter duração de seis a 18 meses, até que a criança ou adolescente retorne à sua família de origem, extensa ou seja encaminhado para adoção.

“A justiça vê com bons olhos até porque é uma forma de diminuir o acolhimento dessas crianças em instituições de abrigamento, porque uma família pode trabalhar melhor essa convivência familiar e comunitária do que uma criança dentro de um abrigo por melhor que ele seja”, reconhece Adhailton Lacet.

Números para denúncias

Ao perceber que uma criança ou adolescente pode estar sendo vítima de violência, é possível fazer uma denúncias por meio dos Conselhos Tutelares ou por meio dos telefones:

Disque 100
Disque 123
Disque 197
Delegacia – 3214-3255

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