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Clara Velloso Borges é escritora, professora de literatura e mestranda em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: [email protected]  

A Nigéria é logo ali

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publicado em 22/10/2021 às 07h39

A internet talvez seja o mais recorrente símbolo para representar a conexão entre culturas na sociedade moderna. Por vezes, é vilã, por afastar quem está fisicamente próximo; por vezes, mocinha, por ser um instrumento que encurta distâncias geográficas. Entretanto, muito antes das redes digitais, a Literatura já viajava o mundo compartilhando mensagens. Mais do que simplesmente expandir o alcance de ideias, a Literatura concede voz àqueles comumente silenciados, fazendo com que a conexão seja aprofundada em relações de empatia.

Chimamanda Ngozi Adichie, brilhante escritora nigeriana, discorre sobre como países ao sul global são comumente retratados de forma limitada, explorando uma única face de sua complexidade. Ao repetir à exaustão uma vertente, propaga-se uma história única, negligenciando a riqueza de detalhes que uma cultura pode construir. Afinal, se o conhecimento é sedimentado a partir das histórias que conhecemos, quanto mais diversas elas forem, mais complexa será nossa compreensão sobre determinado assunto.

Nesse sentido, a própria Chimamanda é um nome fundamental na construção identitária de uma África plural na modernidade. Seus livros revelam o horror da guerra de Biafra, as dificuldades da imigração e as tradições de grupos étnicos. Assim, traça um panorama social, político e religioso da Nigéria atual. Há quem diga que Americanah, romance sobre uma jovem que imigra para os Estados Unidos, é sobretudo uma história de amor. Discordo. Assim como a maior parte das narrativas de Adichie, Americanah é uma história de pertencimento.

Mesmo tendo se tornado um ícone literário, com discursos em performances da cantora Beyoncé, nem só de Chimamanda vive a Literatura nigeriana. Antes dela, houve Buchi Emecheta. A autora, nascida em 1944, não pôde estudar tanto quanto gostaria na juventude, viveu um casamento abusivo e viu seu primeiro manuscrito de um romance ser queimado pelo então marido. Todavia, Emecheta persistiu na Literatura, publicando histórias intrigantes, que desafiam os costumes e as expectativas direcionadas às mulheres nigerianas. Com tantas narrativas plurais, que abraçam tensões culturais, efeitos pós-coloniais e, principalmente, a humanidade de quem não conhecemos, a Literatura fala mais alto do que um atlas.

A Nigéria se mostra logo ali.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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