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entrevista ao maispb

Artista da PB desabafa: ‘Perplexo com desmonte’

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publicado em 03/06/2020 às 09h59
atualizado em 03/06/2020 às 08h55

Há mais de meio século, o jovem artista paraibano Roberto Lúcio, trocou João Pessoa por Recife. João Câmara, Raul Córdula e o Ariano Suassuna também fizeram isso. Era o fatídico 1964 e Roberto foi estudar Arquitetura, mas na mesma época, fez vestibular para Escola de Belas Artes, atualmente Escola de Artes da UFPE.

Por incrível que pareça foi o cheiro da tinta – e não a visão – o sentido determinante da escolha do artista pela pintura. Em entrevista ao MaisPB, Roberto, que reside em Olinda, comenta sobre sua produção na pandemia e chega a lembrar o filme de François Truffaut, “Fahremheit 451” ( 1966), que trata de uma sociedade que baniu todos os materiais de leitura, transformando os livros em fogueira.

Confira a entrevista exclusiva ao MaisPB e descubra mais sobre o pensamento do artista.

1 – Como está a produção artística de Roberto Lúcio, nessa pandemia?

Inquieto, perplexo com o desmonte na área cultural. O estrago ( programado?), será incalculável, atingirá várias gerações. Lembra muito o filme de François Truffaut, “Fahremheit 451”, que trata de uma sociedade que baniu todos os materiais de leitura, transformando os livros em fogueira. (451 é a temperatura que o papel queima.) Continuo em quarentena, com todo tempo do mundo para produzir, não sinto tédio, muitos afazeres como cozinhar, lavar, limpar o ateliê/casa repleto de obras, cuidar do meu acervo, ler, ouvir música, e criar novos trabalhos. Tentando arrumar a mapoteca encontrei um vasto material de desenhos antigos, pinturas sobre papel que nunca foram mostrados, estou me detendo e estudando esse material que poderá me alimentar para novas experiências.

2 – Tem dado continuidade ao projeto de transformação de imagens fotográficas em obra de arte?

Estudo a série “A Casa Acesa”, principalmente os objetos de parede e montagens com madeira e cetim, com materialidades muito aproximadas às dos brinquedos populares. Dando continuidade ao trabalho de fotografias, que já se incorporou ao meu projeto de vida, dispondo de tempo maior para reflexão sem nenhum compromisso com exposição, continuo desenvolvendo trabalhos em torno do corpo, às vezes dialoga com a pintura, ou a pintura se funde com imagens fotográficas. Prosseguindo a série fotográfica Entranhamentos que há anos venho me debruçando, trata-se de imagens de árvores, plantas onde faço analogia com o corpo.

3 – Há tempo morando em Olinda, sua obra já foi vista em vários países com criticas favoráveis. Vamos sobre isso?

Tive oportunidade de ser convidado e participado de diversas exposições fora do Brasil, principalmente na Alemanha. destacando-se Kerkstatt Berlin/São Paulo, Staatliche Kunsthalle Berlin / Querschnitt I e II Galerie Noé Berlin / 5 Aus Brasilien, Die Pumpe, Berlin / Brasilianische Kunst , Kunstler Haus, Berlin / Galerie Gebr. Lehmann, Dresden / Galerie Barsikow Berlin / Arte Brasil Heute, Europaisches Patent Office, Munique. Morei e trabalhei uma temporada nos Estados Unidos em Urban/Champaigne, Illinois, onde realizei exposição individual no Krannert Art Museum. Tempo depois participei com exposição na Neuhoff Gallery em Nova Iorque, onde mantive contrato por 2 anos.

4 – Roberto Lúcio tem perfil no Instagram, onde posta suas obras. Você acredita que as redes sociais aproximam e conquistam um público diferenciado?

Acho interessante as redes sociais como divulgação dos trabalhos para um grande público, não disponho de dados para fazer uma afirmação mais concreta. Efetuei algumas vendas de fotografias para Rio, São Paulo, Recife.

5 – Como anda mercado de arte? Tem sido difícil vender obras antes ou durante a pandemia?

Com a proliferação dos sites de vendas de arte na internet, o público carente de informações é enganado com fotografias impressas sobre telas (canvas), ausência de assinatura do autor, e limite de tiragem. São reproduções dirigidas ao mercado da decoração, onde os clientes escolhem tema e formatos, Quadros medindo 100x150cm vendidos ao preço de R$ 600,00 divididos em 10 pagamentos. Antes da pandemia, o mercado de arte já estava confuso, acho até que as artes em geral estavam se nivelando por baixo, ou seja sem nenhum grau de exigência para serem divulgadas e absorvidas pelo público. Com o advento dos sites de vendas de arte na Internet, o público carente de informações é enganado com fotografias impressas sobre canvas, ausência de assinatura do autor e limite de tiragem, ou seja são “reproduções” dirigidas ao mercado da decoração, onde os clientes escolhem os temas e formatos das obras”. A obra de arte requer raridade, colocação e preço, como colocou o grande galerista Leo Castelli, marchand que lançou a Pop Art, dando visibilidade aos artistas como Lichtenstein, Jarper Jonhs, Rauschenberg, Andy Warhol, Pollock entre outros. Manteve galeria por 5 décadas em NY, trabalhando com artistas da Pop Art, Minimalistas e Arte Conceitual.

6 – Por que Pernambuco lhe conquistou de uma maneira tão extensa que já somam mais 50 anos?

Quando fui morar em Recife a intenção era fazer arquitetura, na época não havia curso na UFPB.

Ingressei na Escola de Belas Artes da UFPE, posteriormente passou a chamar-se Escola de Artes. Fiz curso de Desenho, Pintura e Artes Gráficas, comecei a trabalhar com programação visual. Recife fervia de acontecimentos culturais, Teatro Popular do Nordestes, cinema super 8, festivais de música MPB, uma geração de jovens reagindo aos acontecimentos políticos do famigerado AI 5.

7 – O mundo jamais será o mesmo. Como será o ser humano depois de toda essa guerra biológica?

Creio que haverá uma nova forma de pensar o mundo, a tecnologia da informação e o distanciamento social agravado nessa pandemia, antecipou esse tempo para hoje; acontecimentos que seriam incorporados ao nosso cotidiano nos próximos 10 anos, já estão fazendo parte da nossa vida. O abismo social ficará mais profundo. Pós pandemia, não seremos os mesmos

Kubitschek Pinheiro – MaisPB

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