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Exclusivo: Adriana Calcanhotto fala sobre novo CD e se emociona ao homenagear Gal

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publicado em 29/04/2023 às 11h59
atualizado em 30/04/2023 às 06h09

Kubitschek Pinheiro MaisPB

Fotos Leo Aversa e Giordano Toldo

Errante, o 13º disco de Adriana Calcanhotto já está nas plataformas e dá nome à turnê que a artista vai iniciar, depois da temporada de shows – “Gal Coisas Sagradas Permanecem”, que teve início na última quinta-feira, em Porto Alegre, onde nasceu Adriana. Errante com selo alemão, traz composições inéditas.

Entre 2020 e 2021, Adriana Calcanhotto recebeu de presente o violão que havia sido de Orlando Silva (1915-1978), o “cantor das multidões”. Mais surpreendente que o presente em si foi a descoberta de que Orlando usava a mesma afinação que ela havia adotado há pouco tempo.

O nome e o design da capa do álbum, elaborado a partir de carimbos de vistos e fotos de passaportes de Adriana, sugerem que o tema abordado nesse novo trabalho da gaúcha é o vagar, andar sem rumo, não ficar parado. As letras das canções que integram “Errante” trazem essa vontade de caminhar, avançar.

A primeira faixa, “Prova dos nove”, já sugere isso no verso “em tudo o que faço sou não mais do que impostora”, conferindo o sentido de se equivocar ao verbo errar. No final da canção aparecem palmas e gargalhadas gerais da banda.Foi no violão de Orlando Silva que Adriana compôs metade das 11 canções de “Errante”. As outras canções, foram compostas no violão que pertenceu a Nara Leão e que também está sob os cuidados de Adriana

Certezas e incertezas, sambas, xote e a coisa toda nas canções de “Errante” com arranjos diversificados, tocados pelos músicos Alberto e Jorge Continentino, Davi Moraes, Domenico Lancelotti, Diogo Gomes e Marlon Sette.

O show para Gal

O show “Gal: Coisas Sagradas Permanecem”, de Adriana Calcanhotto teve turnê nacional iniciada na última quinta-feira, (27), no Salão de Atos da PUCRS, em Porto Alegre. O espetáculo nasceu a partir de uma sacada de Marcus Preto, produtor e diretor artístico de álbuns e shows de Gal nos últimos nove anos. Um show com a mesma equipe que tocava com Gal.

Marcus Preto manifestou o desejo de fazer uma homenagem à cantora baiana.Quando pensou em qual cantora poderia estar à frente do projeto, Marcus Preto apontou para Adriana. “Como Gal, ela foi das raras artistas do Brasil que souberam fazer um trânsito fluente entre a vanguarda da música brasileira e os hits das rádios populares

Durante a apresentação, ao finalizar a música “Dê Um Rolê”, Adriana abriu a camisa e ficou com os seios de fora. Ao encerrar a canção, ela desfilou pela beirada do palco, arrancando aplausos e sendo ovacionada pelo público. Adriana é Fa-Tal.

Adriana Calcanhotto conversou com o MaisPB pelo telefone e traz as novidades de uma garota “errante” que acerta em tudo.

MaisPB – “Errante”, é um bom nome e você abre o álbum cantando “Prova dos Nove” e nos remete para o velho acerto de contas. Você lembra dessa coisa da prova dos 9?

Adriana Calcanhotto – Lembro, sim. Essa letra, essa canção nos remete para a prova das coisas.

MaisPB – Essa canção que abre o disco “Prova dos Nove” está sendo chamada de autorretrato, mas Adriana é cosmopolita, não é?

Adriana Calcanhotto – Você tem razão, eu sempre me senti cosmopolita, desde criança que eu queria ganhar o mundo. O autorretrato sai assim, porque eu sou assim.

MaisPB – Quando você passou aquela temporada em Portugal, ministrando aulas na Universidade de Coimbra, já era a Adriana do mundo. Mas a letra “Prova dos Nove”, é pequena com palavras que ampliam continentes, o “corpo italiano, a alma lusitana e parida no Brasil…

Adriana Calcanhotto – Eu gosto de letra curta. Nesse disco tem outra canção pequena. Eu estou aí nesses versos, sou daqui, de muitos lugares.

MaisPB – Como é essa história, que aparece nos créditos de algumas canções, – voz e violão, Orlando Silva, ou voz e violão Nara Leão?

Adriana Calcanhotto – São os violões que eram deles, eu toco esses violões aqui em casa, componho neles, já fiz várias canções, eu tenho violões de outras pessoas. Mas esses são instrumentos extraordinários. Eu vi que o som desses instrumentos tinham a ver com esse repertório, que virou o disco Errante.

MaisPB – Tudo bem definido?

Adriana Calcanhotto – Sim. Quando fui para o estúdio, tinha canções inéditas e a banda. Não sabia que cara elas tinham, que recorte, que nome ia ter. Mas eu sabia que pela sonoridade tinha a ver com as coisas que a gente ia gravar – e gravei com esses violões. Fiquei com vontade de tocar o som deles, tocados por mim e partilhar essa informação.

MaisPB – Como esses violões chegaram até você, leilões, emprestados?

Adriana Calcanhotto – Não, não. As pessoas têm esses violões, mas não tocam. Na casa delas, os violões ficam numa caixa, em cima do armário, comigo eu toco, componho, afino, eu mimo. Eles ficam mais felizes aqui. Volta e meia chega uma maravilha aqui para mim.

MaisPB – A segunda faixa “Larga Tudo”. Lembra a canção “Alvorada” de Cartola, quando você diz “quando chegar a alvorada eu já vou na estrada” é tão bonito isso e é quase uma cantada?

Adriana Calcanhotto – Tomara que você esteja certo. Acho isso bom, vindo de você, dessa canção lembrar Cartola. Essa canção é a estrada, é a estrada que me leva. Eu acho que é mais uma cantada do que uma briga. Aliás, eu vou embora de qualquer jeito, né?

MaisPB – A quarta faixa, “Quem te disse?” se encaixa no repertório das canções da cantora Maria Bethânia, que já gravou várias canções suas. É a cara dela, poderia ter dado para ela gravar…

Adriana Calcanhotto – Que bom! Acho que ela ficaria bonita na voz da Bethânia, mas acontece que se eu mandar todas as canções para ela, não tenho como fazer disco, tenho que guardar umas para mim…

MaisPB – Aliás, Maria Bethânia gravou sua canção “Miguel”, (que nos remete para o menino que caiu do prédio em Recife, em junho de 2020) – o grito dela no final da canção é de arrepiar…

Adriana Calcanhotto – Exato, ela canta essa canção que não dá nem para eu pensar em gravar.

MaisPB – Ainda sobre “Quem te disse? A canção faz uma alusão a Península Ibérica, Afrodite, Sefaradi…

Adriana Calcanhotto – Exatamente. Essa canção é muito forte, ela atravessa mares

MaisPB – Essas canções ainda são daquela pandemia, que você compôs muito, né?

Adriana Calcanhotto – Eu não componho tanto assim, mas ter 18 canções como eu tinha, é um fenômeno no meu caso. Fui para o estúdio com essas 18 canções e elas são de 2021, e temos algumas de 2016. Eu fiz umas antes de ir para o estúdio. Tem duas canções que eu terminei a letra no estúdio, um pouco antes de colocar a voz. Eu não tenho como dizer quando elas foram feitas, entre 2016 e 2021, mas elas têm várias fases diferentes.MaisPB – Nesse meio tempo você fez a turnê Mulher do Pau Brasil…Adriana Calcanhotto – Sim, eu fiz também “Margem”, viajei com a turnê Margem, tudo isso são canções que fui fazendo na estrada, quando fazia esse trabalho.

MaisPB – Tem uma canção nesse disco, cuja frase “Tu me ensina a fazer renda…” lembra o compositor paraibano, Zé do Norte?

Adriana Calcanhotto – É sim, essa canção eu gosto e gosto da obra de Zé do Norte, um valoroso artista paraibano

MaisPB – A quarta faixa “Levou para o samba a minha fantasia” é um samba bonito, memorável

Adriana Calcanhotto – É irresistível, levou para o samba a minha fantasia. De Ser feliz um dia. Essa canção eu toco com o violão que foi de Orlando Silva.

MaisPB – Suas canções namoram uma com as outras, né?

Adriana Calcanhotto – Sim, concordo. As canções namoram, elas tem essa ligação com a memória no espaço de cada uma.

MaisPB – “Era isso o amor?” A quinta faixa tem uma pegada do rock?

Adriana Calcanhotto – Na verdade, eu compus e toquei na gravação como samba, os meninos que estão tocando com rock and roll. Esse namoro do samba com o rock rola e dá certo, sem nenhuma forçação de barra. Eu mostrei para eles como samba, quando subimos para a parte técnica para ouvir gostamos muito e eu sigo tocando violão.

MaisPB – Vamos falar dessa canção Lovely, a oitava faixa?

Adriana Calcanhotto – É porque essa palavra Lovely, que quer dizer em português “sem forma” e a gente não consegue dizer com uma palavra só, não tem o jeito de dizer e para dizer do jeito que eu queria, eu fiz a letra em inglês.

MaisPB – E essa canção “Reticências”, a nona faixa, nunca vi uma canção com esse nome?

Adriana Calcanhotto – Também não. O Caetano (Veloso) tem uma com o nome de Etc.

MaisPB – “Pra lhe Dizer” é xote bom demais…

Adriana Calcanhotto – Ah, é um xote sim, que tem um ritmo andante, que tem a ver com as coisas do disco, que é andar, o que importa é andar e não chegar.

MaisPB – “Horácio de Verão”, uma canção inusitada?

Adriana Calcanhotto – É uma canção que veio, assim mesmo, inusitada.

MaisPB – Fecha o disco com “Nômade”, uma canção forte que segue no caminho pela pintora Lygia Clark (1920 – 1988), criadora da instalação “A casa é o corpo”,(1968), cujo título é citado na letra que também embute frases de Gilberto Gil?

Adriana Calcanhotto – Nômade somos todos nós. Essa canção faz esse caminho para todos nós. Esta eu compus depois da viagem com o Gilberto Gil e é inspirada nele, na estrada e nas frases que ele dizia para as pessoas.

Adriana canta Gal

O show “Gal: Coisas Sagradas permanecem”, de Adriana Calcanhotto teve turnê nacional iniciada na última quinta-feira, (27 ) no Salão de Atos da PUCRS, em Porto Alegre. O espetáculo nasceu a partir de uma sacada de Marcus Preto, produtor e diretor artístico de álbuns e shows de Gal nos últimos nove anos. Um show com a mesma equipe que tocava com Gal. Marcus Preto manifestou o desejo de fazer uma homenagem à cantora baiana.Quando pensou em qual cantora poderia estar à frente do projeto, Marcus Preto apontou para Adriana. “Como Gal, ela foi das raras artistas do Brasil que souberam fazer um trânsito fluente entre a vanguarda da música brasileira e os hits das rádios populares”

MaisPB – Como aconteceu o convite para cantar Gal Costa?

Adriana Calcanhotto – Tinha uma conversa de Wally Salomão que chamava Gal de Vagal, uma brincadeira dele com ela, ele também era baiano, aquela conversa da preguiça. Mas vagal tinha outro sentido, só que na sociedade de consumo, hoje é ofensivo, mas eu não considero ofensivo. Quando ela gravou aquela música de Cole Porter, I’m the most vagabond girl (Eu sou a garota mais vagal), ela gravou porque no título Cole Porter colocou Gal, pra dizer garota, e muitas pessoas acharam que ela gravou por causa do nome Gal. Esse show já estava marcado, Marcus Preto, que foi produtor de Gal durante anos chegou como esse tributo, eu topei na hora.

MaisPB – E as canções desse show?

Adriana Calcanhotto – “Recanto Escuro” abre o show, – que é um dos melhores discos que Caetano fez para o Gal.

MaisPB – Tem sido muito triste, viver sem Gal, né?

Adriana Calcanhotto – Muito triste, inesperado, aquela pessoa partiu. Eu fico o dia inteiro aqui ouvindo a voz dela, vendo o making of, vendo shows, é muito difícil de acreditar

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