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ENTREVISTA MAISTV

Teresa Cristina, filha do samba e Rainha das Lives

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publicado em 26/09/2020 às 15h59
atualizado em 27/09/2020 às 06h54

Kubitschek Pinheiro – MaisPB
Fotos – Marcos Hermes e Lucas Bori

Teresa Cristina é uma das maiores sambistas do Brasil, mas ela não só canta samba. Canta tudo que existe de bom na música brasileira. Canta Caetano Veloso, Roberto Carlos, Chico Buarque, Paulinho da Viola e outros, principalmente agora com as lives de todo santo dia. Ela vem dos aplausos das plateias da Lapa carioca, onde despontou no cenário musical no fim dos anos 1990. Hoje, somando quase 30 anos de carreira, a cantora já foi premiada com o Rival BR e o Prêmio Tim de Música como “cantora revelação” pelo álbum “A Música de Paulinho da Viola”. Pelo mesmo trabalho, foi indicada ao Grammy Latino de melhor disco de samba de 2003. Anos mais tarde, explorou sua faceta compositora nos CDs “Delicada” e “Melhor Assim”.

Depois de cantar Cartola e Noel Rosa, espetáculos aplaudidos de pé em todo pais, com direção de Caetano Veloso (o resultado saiu em DVDs), ela deu início, antes da pandemia, ao show “Um sorriso negro”, com uma banda só de mulheres: Samara Líbano, Jéssica Zarpei, Ana Paula Cruz, Elisa Dor e Roberta Nistra. Nesse espetáculo. Teresa canta e as meninas tocam canções de compositores negros brasileiros. O projeto será retomado pós pandemia.

Em entrevista ao MaisPB, ela faz um resumo sobre sua arte, as diversificadas cenas, as lives que atraem um público enorme do mundo inteiro, (acontecem todas às noites em seu Instagram teresacristinaoficial, que soma quase 400 mil seguidores). Também comenta os projetos realizados, fala da vida, do Brasil, Noel Rosa e a da alegria de fazer sua mãe Dona Hilda sorrir ( nas lives domingueiras), quando as duas cantam juntas. Teresa é muito mais que uma voz.

MaisPB – Foi a luz da turnê “Cartola”, que fez você pensar em cantar Noel Rosa?

Teresa Cristina – O que me fez bater o martelo para fazer o Noel mesmo, foi o Brasil. O nosso pais entrou numa onda de retrocesso, a gente tem andando tanto para trás, até que esbarramos no tempo do Noel. Aí eu pensei: tá na hora de pegar Noel Rosa de volta. Essa coisa que Noel falava ainda é real, ainda faz sentido. Isso foi o que me deu mais vontade de fazer Noel Rosa.

MaisPB – Os sambas de Noel tem pancadas fortes. “Não tem tradução”, com que roupa eu vou ao samba que você me convidou e tem aquela canção que Caetano Veloso fez “como pode querer que mulher vá viver sem mentir”, inspirado numa canção de Noel. Vamos falar sobre isso?

Teresa Cristina – Sim, “Pra que mentir”. A canção que Caetano fez é” Dom de Iludir”, é linda, ele faz isso com muita maestria – “Não me venha falar na malícia, de toda mulher, cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”, canta ela pelo telefone. E segue: “Noel é um artista tão importante para a cultura brasileira”.

MaisPB – A direção é de Caetano Veloso. Acho que ele está lhe devendo uma canção. Já fez para Cassia Eller, Mart’nália, Marina, Negra Lee, Angela RoRo e …

Teresa Cristina – Sim, a direção do Caetano Veloso é primorosa e a obra de Noel é eterna. Eu tenho um carinho e uma admiração enorme por Caetano, imensa, imensa. Ele é muito importante para a cultura do nosso país. Tão atencioso com outros artistas, uma pessoa tão amiga, carinhosa. Mas, olha gostei disso aí que você disse: tomara que Caetano faça uma música só pra mim. Tomara. Eu vou ficar muito feliz. Ele é muito bom, tem aura, uma beleza.

MaisPB – O DVD do show de Noel é muito bonito….

Teresa Cristina – O DVD saiu agora, depois de dois anos da temporada de shows. Eu não penso em continuar com Noel, pelo menos no momento. Depois da pandemia vou retomar meu show “Sorriso Negro”, que é com minha banda só de mulheres. A minha ideía é essa: percorrer o Brasil fazendo esse show.

MaisPB – Uma banda só de mulheres, que maravilha?

Teresa Cristina – Olha elas são maravilhosas, tem a flautista Ana Paula Cruz, ( que abre as lives com Teresa), tem Samara Líbano, Jéssica Zarpei, uma ótima percursionista, de 21 anos, a Elisa Dor, Roberta Nistra, cavaquinhista. Gisele Sorriso no sopro, Clarice no pandeiro e Eliza Dor na percussão e coro…

MaisPB – Então, podemos esperar “Sorriso Negro” chegar ao Nordeste?

Teresa Cristina – Já estivemos aí em Fortaleza. Fizemos Rio, São Paulo e Fortaleza. E quero levar esse show para João Pessoa. Nesse show eu canto compositores negros brasileiros. Ai, dentro desse perfil eu me encaixo e canto minhas músicas também. Agora tem uma coisa: aparecendo uma oportunidade de fazer Noel de novo eu faço com maior prazer. Eu amo esse show.

Lives

Quando as lives começaram a surgir nas redes sociais, Teresa Cristina não contou até três. Ela vai de encontrou aos fãs com sua arte para fugir do medo e da ansiedade que rondavam. Sem poder fazer shows, viu nas lives essa oportunidade.

Segundo ela, tudo começou de forma despretensiosa e tomou uma proporção que Teresa nem poderia imaginar. Ela sempre aparece alegre, feliz e já recebeu convidados ilustres como Gilberto Gil, Caetano Veloso, Alcione e Simone, Ney Matogrosso, Chico Buarque ( Maria Bethânia mandou um áudio) e muitos outros.

Cada dia é um novidade e uma surpresa que emocionam a artista e o público. As lives diárias acontecem às 22h, no Instagram (@teresacristinaoficial).

MaisPB – Lembra quando foi a primeira live?

Teresa Cristina – Foi logo no início da pandemia. A primeira eu fiz explicando o que era samba de terreiro. Eu percebi que muitas pessoas não sabiam o que era samba de terreiro. Muitos achavam que teria algo a ver com os orixás. Samba de terreira não é isso. É o samba de quadras. (estes sambas ficaram conhecidos assim, porque eles eram produzidos durante todo o ano nos espaços que se tornariam as futuras quadras. Antes de ser cimentado, o chão do terreiro era feito de terra batida)

MaisPB – Daí você emendou em outros temas, né?

Teresa Cristina – Eu comecei falar sobre isso, samba da comunidade, de terreiro, de quadra, das escolas. Depois eu diz falando sobre as Escolas Portela e Mangueira, que eu gosto muito. Nessas eu cantei sambas históricos.

MaisPB – Também teve A Batalha entre Zé Keti e Cartola?

Teresa Cristina – Essa temporada foi ótima, uma hora eu cantava Cartola outra Zé Keti. São dois artistas que eu gosto muito de cantar.

Mais PB -Depois vieram os convidados, Mônica Salmaso….

Teresa Cristina – Com Monica ( Salmaso) eu faço todas às quintas feiras, fazemos A Batalha das Cantoras. É muito bom cantar com ela, que tem uma voz linda. Mônica conhece muito de música. Agora os convidados vieram com o tempo. As pessoas foram entrando na lives, muito espontaneamente. Quando eu percebi já era uma prática, uma vontade delas estarem comigo. E já estavam acostumadas a frequentar e ficar. São meses de pandemia, né? Seis meses que eu estou fazendo lives. E todos os dias.

MaisPB – Qual a sensação de estar em contato com os fãs, você cantando para o mundo?

Teresa Cristina – Tenho aprendido muito nessas lives. Eu fico entrando em contato com o nosso país, que existe, né? O Brasil existe. O nosso pais existe. Tá vivo, é uma cultura muito forte, muito rica. Em todos os lugares tem um som. Isso é muito gratificante, saber que o Brasil é rico culturalmente. A música brasileira vem de todas as regiões e isso me deixa realizada, querendo mais. Quando vi, estava com lives todos os dias. Percebi a minha animação ao pesquisar os temas e curiosidades, que eu apresentaria à noite, virou uma troca de ideias com as pessoas do mundo todo.

Jovens Lives de Domingo

Todos os domingos, Teresa Cristina faz a live com sua mãe Dona Hilda Macedo, – essas não são pelo Instragam, mas no seu canal do YouTube. São clássicos do samba cantados ao lado da mãe em “Jovens lives de domingo”, sempre às 15h, no YouTube (/teresacristinaoficial).

É uma cena amorosa, um canto junto do outro, a realização da filha, na voz da mãe, que sonhava em ser cantora, em chegar ao Rio e ver os artistas, algo assim tão certo, que Teresa agora está realizando.

MaisPB – Como aconteceu de colocar Dona Hilda nas lives, aos domingo?

Teresa Cristina – A ideia inicial quando comecei fazer as lives, era pensando nessa live com minha mãe. Queria distrair ela, deixar minha mãe pensando em outra coisa, que não fosse a morte. Além do noticiário terrível de todo dia. Isso faz muito mal pra gente, pra nossa cabeça. Ai começamos essa live aos domingo para ela, para saúde mental dela e vê-la se divertir.

MaisPB – Era um sonho dela ser cantora?

Teresa Cristina – Sim, ela tem uma voz linda, isso é uma coisa da infância. Ela queria muito ser cantora e todos os domingos eu realizo esse sonho. É das maiores alegrias que eu tenho. Você botar sorriso na sua mãe, não tem preço. Minha mãe é meu tesouro, meu sonho, meu samba

.MaisPB – Tem escutado outros cantores?

Teresa Cristina – Eu tenho ouvido mais música da pesquisa, para as lives. Eu tenho uma saudade de ouvir Nina Simone, adoro a Ella Fitzgerald, aquele timbre de voz angelical, é quando eu estou mais próxima de Deus.

MaisPB – Lembra quando você esteve aqui na João Pessoa?

Teresa Cristina – Sim, eu fui ai com Monarco e Roque Ferreira (no Projeto Pixinguinha, 2004)

MaisPB – Está lendo um bom livro?

Teresa Cristina – Estou lendo “Um defeito de Cor”, de Ana Maria Gonçalves. ( O livro conta uma história de uma africana idosa, cega e à beira da morte, que viaja da África para o Brasil em busca do filho perdido há décadas).

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