João Pessoa, 11 de novembro de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora

Titular em Letras Clássicas, professor de Língua Latina, Literatura Latina e Literatura Grega da UFPB. Escritor, é membro da Academia Paraibana de Letras. E-mail: [email protected]

De porcos e de homens

Comentários: 0
publicado em 11/11/2021 às 06h53

O final de A Revolução dos Bichos ou, como já vi em nova tradução, A fazendo dos animais (Animal farm), de Orwell, é emblemático. Sabemos todos que Orwell escreveu um romance, 1984, e aquela fábula moderna, com a intenção de fazer uma crítica pesada ao totalitarismo comunista, mais especificamente ao stalinismo. A fábula é de 1945, quando o stalinismo e o sovietismo, após a o final da segunda guerra mundial, entrariam no seu apogeu.

Pelo fato de caracterizar-se como uma fábula e ser de menor extensão do que seria o romance 1984, A revolução dos bichos atingiu, na minha concepção, de forma mais contundente o seu objetivo: o comunismo que se erigiu tendo como bandeira a defesa do povo explorado pelos aristocratas russos, acaba se convertendo em culto à personalidade do líder supremo e com sua cúpula distanciando-se cada vez mais do povo que dizia proteger, para se parecer com os antigos exploradores aristocratas.

No livro de Orwell, os porcos, que haviam tomado o poder da granja do sr. Jones e eram liderados pelo porco Napoleão, nome mais do que simbólico, mostram-se felizes por estarem confraternizando com os humanos, seus antigos exploradores, comemorando o fim dos desentendimentos. Para chegar a isto, foi necessário que, sistematicamente, os preceitos antigos contra os exploradores fossem sendo modificados, para se adequar aos privilégios da cúpula comandada por Napoleão, tendo em Garganta, outro nome simbólico, o seu secretário da propaganda, cujo cerne todos conhecem – repitam uma mentira ininterruptamente, por mais que os fatos demonstrem a sua falsidade, pois haverá sempre quem nela acredite, como o cavalo Sansão,

No auge da confraternização, porcos falam tão alto e vociferam no mesmo tom como os humanos, mas não se trata de uma briga, que leve a novas dissensões entre porcos e homens, é uma briga para delimitação do terreno, visto que o poder que se partilha entre eles há um só objetivo: exploração dos incautos. Eles são pares inter pares.

Na confraternização, o que ocasiona a briga é o fato de que o Sr. Pilkington e o porco Napoleão tinham apresentado os dois, ao mesmo tempo, um ás de espadas. A descrição de Orwell não poderia ser mais precisa, concluindo o livro:

“Doze vozes gritavam, cheias de ódio, e eram todas iguais. Não havia dúvida, agora, quanto ao que sucedera à fisionomia dos porcos. As criaturas de fora olhavam de um porco para um homem, de um homem para um porco e de um porco para um homem outra vez; mas já era impossível distinguir quem era homem, quem era porco.”

Escrevo isto pensando na atualidade de Orwell. As brigas entre iguais é apenas para marcar posição e estabelecer de modo claro que iguais mandam, os desiguais obedecem cegamente. Os desentendimentos são apenas pontuais. Não há inimizades, pois haverá sempre alianças espúrias, quando o objetivo é a exploração do resto da população que, fora do jogo de iguais, trabalha como o cavalo Sansão para sustentar Pilkingtons e Napoleões. É ou não é o que temos visto nas alianças mais do que discutíveis entre os partidos? As eleições estão próximas e é só pagar para ver.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

Leia Também