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João Medeiros é pediatra e presidente da Academia Paraibana de Medicina. E-mail: [email protected]

Cirurgia sem dor

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publicado em 22/10/2020 às 06h51

É quase inimaginável que até meados do século XIX, os procedimentos invasivos, cirúrgicos eram realizados “a cru”, geralmente valendo-se de métodos mais compassivos do que realmente efetivos para aliviar a dor do paciente, tais como, o mesmerismo de Franz Anton Mesmer – hipnotizador da moda em Paris, que emitia “magnetismo animal”- , o ópio ou a cannabis, mandrágora ou bebida alcoólica em doses generosas, certamente sob forte contenção – a “ segurocaína”.

Os cirurgiões se notabilizavam pela rapidez com que executavam os procedimentos, a exemplo de Robert Liston, (foto) um homenzarrão escocês, conhecido como “dedos de relâmpago”, tamanha sua habilidade, chegando a amputar uma perna em dois minutos e meio. Numa postura entre misericordioso a carrasco, segurava o bisturi entre os dentes, para ficar com as mãos livres e economizar tempo.

As tentativas fracassadas do uso dos óxido nitroso, o gás hilariante – inclusive com desfecho fatal de um paciente – , por Wells e Morton resultaram no abandono do seu uso. No entanto, Morton não desistiu, e, lendo na Matéria Medica o relato de que o éter ( “ óleo doce de vitríolo”descoberto pelo botânico Valerius Cordus em 1540) era capaz de anestesiar, resolveu experimentá- lo no seu cão, logrando excelente resultado. O éter é mais poderoso e mais seguro que o óxido nitroso que pode provocar asfixia, quando usado em concentração inadequada. O feito de Morton, que não era médico, e sim , odontólogo, lhe garantiu o notável pioneirismo da descoberta de um anestésico mais seguro e que passou a ser usado largamente.

O clorofórmio depois foi incorporado ao arsenal do médico, numa época em que o profissional era conhecido como o “anestesiador”. Um dos precursores no seu uso em nosso meio foi o Dr. Flávio Ferreira da Silva Maroja, médico notável, figura polivalente, amante das arte e das letras que dirigiu o Hospital da Santa Casa por quase 50 anos, formado no Rio de Janeiro em 1888.

Até poucas décadas atrás o éter era muito usado , inclusive em crianças e, em Obstetrícia, a famosa máscara de Ombrédanne era comumente empregada na Maternidade Cândida Vargas, na minha época de estudante. Posteriormente, diversos fármacos foram incorporados à moderna anestesiologia, no entanto, foge do escopo deste texto discorrer sobre eles, mesmo porque não sou expert na matéria.

Hoje, certamente os procedimentos invasivos são realizados com muita segurança, conforto e sem dor para o paciente , graças ao extraordinário avanço nessa área do conhecimento médico e a destreza dos colegas anestesiologistas.

Atribui-se a Almir Lopes, o pioneirismo da especialidade, em nosso meio, onde pontificou por pouco tempo, seguindo-se de Clóvis da Silva Borges, Antônio Américo Arruda e Clóvis Beltrão de Albuquerque.

Hoje a Paraíba conta com cerca de 259 profissionais, dos quais, 178 em João Pessoa, atuando com muita dedicação e competência, no alívio da dor e do sofrimento de um número incalculável de pessoas, muitas das quais enfrentando procedimentos cirúrgicos os mais complexos.

No último dia 16, comemorou-se o Dia do Anestesiologista. Nada mais justo do que homenagearmos – todos os profissionais que se dedicam diuturnamente, com amor e denodo, a essa imprescindível área da medicina -, na pessoa do Dr. Clóvis Beltrão, decano da especialidade, na qual atuou com muita ética e competência, por várias décadas, e que para nossa alegria, continua muito lúcido e participativo, no alto dos seus 94 anos de idade. Um exemplo para todas as gerações!

*Pediatra e Presidente da Academia Paraibana de Medicina

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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