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'Meu nome é ébano'

Entrevista: Luiz Melodia ganha biografia singular de Toninho Vaz

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publicado em 12/12/2020 às 09h36
atualizado em 12/12/2020 às 14h32

Kubitschek Pinheiro

Perola Negra. Luiz Melodia (1951-2017). O jornalista e escritor paranaense Toninho Vaz, lançou em plena pandemia a biografia “Meu nome é ébano – A vida e a obra de Luiz Melodia” (Editora Tordesilhas), do cantor e compositor carioca. O livro traz a trajetória do menino criado no Morro de São Carlos, no Rio de Janeiro, que conquistou o Brasil com sua voz, sua música, sua arte e poesia. O autor vai além e mostra um Melodia sensível, complexo e completo, até quando enfrentou problemas com as drogas e o álcool e tantas vezes, o racismo.
Em “Meu nome é ébano – A vida e a obra de Luiz Melodia, o escritor aborda a personalidade do artista, autor de cancioneiro sofisticado e singular. Rebelde, ganhou o pecha de “maldito”, quando se recusou a fazer gravação para a Globo.

Críticos apontam que sua música é “inclassificável”, – do samba, ao rock, soul, blues e jazz. Luiz Melodia começou a carreira musical na década de 1960 e continuou em plena atividade até seu falecimento, em 4 de agosto de 2017
Elegante e sedutor, impressionava as mulheres. Com a capixaba Beatriz Saldanha teve o filho Hiran, advogado. Com a baiana Jane, com quem se relacionou de 1977 até morrer, teve Mahal Reis, rapper.

Vaz viu Melodia pela primeira vez da janela de sua casa. Os dois foram apresentados por um amigo. “Ele disse: ‘Amigo, esse aqui é o jornalista Toninho Vaz, agora nosso vizinho’. Alguns anos depois, em 2003, Toninho o entrevistou no palco do Canecão. “A entrevista era para a biografia do Torquato Neto que eu estava escrevendo”, relembra Vaz.

Toninho Vaz é autor das biografias de Paulo “Paulo Leminski, o bandido que sabia latim (Editora Record, 2001), “Pra mim chega, Torquato Neto” (Editora Casa Amarela, 2004) “Darcy Ribeiro – Nomes que honram o Senado (Editora Senado, 2005), “O fabuloso Zé Rodrix” (Editora Olhares, 2017) e “Solar da fossa” (Editora Casa da Palavra 2011), entre outros.

Existem dois filmes, com a vida e obra de Luiz Melodia. “Todas as melodias”, direção e roteiro de Marco Abujamra, produção e codireção de Mariana Marinho, numa realização de Dona Rosa Filmes. O Outro da Série: Memórias do Brasil / 13 Episódios de 45 minutos dirigido por Diogo Oliveira, que traz Arnaldo Antunes, Black Alien. Elisa Lucinda, Frejat e Jards Macalé, entre outros. “São dois documentários sobre LM rodando por ai. Um terceiro pode estar a caminho, este em fase de produção é baseado no meu livro”, disse Toninho Vaz

Leia a entrevista de Toninho Vaz ao MaisPB e saiba muito mais sobre Luiz Melodia , esse artista gigante que partiu com 66 anos, autor de “Juventude Transviada”, “Estácio, Eu e Você”, “Vale Quanto Pesa”,” Magrelinha”, “Farrapo Humano” “Forró de Janeiro” e muitas outras. “Pérola Negra e “Estácio, Holly Estácio”, foram gravadas por Gal Costa e Maria Bethânia em 1972.

MaisPB – Você vem se destacando nacionalmente como autor de várias biografias. Lembra o que despertou esse interesse por pesquisar e contar histórias de pessoas tão fantásticas?
TV – Comecei casualmente, em 2001, com a biografia de Paulo Leminski, atendendo a sugestão da viúva do poeta, Alice Ruiz, a mesma que depois iria promover a censura ao livro. A minha estreia foi um sucesso do ponto de vista comercial, inclusive. As outras biografias foram consequência.

MaisPB – Como veio a ideia de Luiz Melodia, você de repente pensou e começou a fazer o esqueleto da história do cara na sua cabeça?
TV – Eu não conheci o Melodia, mas era amigo de Renato Piau, que trabalhou décadas como violonista e guitarrista dele. Quando estava completando um ano do seu falecimento, fui à missa em homenagem na igreja de São Conrado, onde o Renato me apresentou à viúva, Jane Reis. Ali mesmo combinamos tudo.

MaisPB – Como foi o ponto de partida para “Meu nome é ébano — A vida e a obra de Luiz Melodia” começar a tomar forma?
TV – Eu contei com uma assistente que marcou as primeiras entrevistas com amigos de infância de Melodia. Foram entrevistas feitas no morro de São Carlos, onde Luiz Melodia nasceu. Conseguimos reunir quatro ou cinco amigos dele e começamos o trabalho. No total foram 64 entrevistas realizadas. Durante dois anos, incluindo o tempo que gastei escrevendo a história.

MaisPB – No livro você foca tudo, do menino de São Carlos, ao artista famoso Melodia?
TV – Sim. Venho contando a história a partir dos pais, Oswaldo e Eurípedes, passando pelo sucesso na música e entrando pelo tempo da carreira nacional e internacional.

MaisPB – Vocês estiveram juntos, durante o tempo em que ele estava vivo?
TV – Sim, pude entrevistar o Melodia quando estava escrevendo a biografia de Torquato Neto, tido como descobridor do talento dele. Foi um encontro rápido, no palco do Canecão quando ele ensaiava para um show que faria mais tarde com a banda. O Renato Piau foi quem me apresentou.

MaisPB – Melodia tinha pouca escolaridade, mas era um artista talentoso. Vamos falar sobre isso?
TV – Verdade. Ele mesmo dizia ter lido um ou dois livros de Herman Hesse e nada mais. Ele falava como Belchior, que dizia “das coisas que aprendi nos discos”. Por isso fez algum sentido quando ele conheceu o poeta Manoel de Barros, na época sogro de Renato Piau. Eles tinham um fazer poético semelhante, ingênuo. O Millor Fernandes dizia que a poesia de Manoel de Barros era “o apogeu do chão”. No final o Melodia fez um disco inspirado em poema do matogrossense, “Retrato do artista quando coisa”.

MaisPB – No livro você revela a imagem do artista que viveu dificuldades, mas também teve as glórias?
TV – Sim, acompanho a trajetória completa de Luiz Melodia, com altos e baixos. Ele se superou e conquistou a glória destinada aos grandes artistas. Vários amigos falam sobre isso e reconhecem a evolução na carreira dele, interrompida precocemente em 2017.

MaisPB – Melodia teve problemas com álcool e drogas e isso ficou público. Você aborda essa parte da vida dele, né?
TV – Não procuro fazer escândalos com revelações intimistas, mas tenho que abordar todos os assuntos, inclusive os indigestos. Sem preconceito.

MaisPB – Melodia enfrentou o racismo, que hoje em dia está cada dia pior. O que você fala em seu livro sobre esse tema?
TV – Eu revelo três episódios de racismo vividos pelo Melodia, puro preconceito. Mas outros amigos dele revelam algo mais. Ele era combativo neste quesito.

MaisPB – Como Jane Melodia reagiu quando você disse que ia escrever a biografia de Luiz Melodia?
TV – A Jane foi impecável, quando puxou pela memória para me contar os fatos como eles aconteceram, como na liberdade que tive para trabalhar.

MaisPB – As imagens do livro você conseguiu como?
TV – Muitas fotos eram do arquivo pessoal da Jane Reis, outras do Renato Piau e outras ainda de fotógrafos que registraram shows dele pelo Brasil, como a foto da capa, do paulista Mario Luiz Thompson.

MaisPB – O titulo “Meu nome é ébano – A vida e a obra de Luiz Melodia” é da canção Ébano, né?
TV – Sim, o título é uma referência à música que ele defendeu no Festival Abertura da TV Globo. Funciona como uma assinatura do orgulho negro, ou black como se dizia.

MaisPB – Você chegou a falar com os filhos Com a capixaba Beatriz Saldanha Hiran, advogado do casamento com capixaba Beatriz Saldanha e Mahal Reis, rapper, do casamento com Jane?
TV – Entrevistei todos. Inclusive uma namorada chamada Glorinha que era filha de intelectuais da zona sul do Rio. Os filhos também. Todos entrevistados.

MaisPB – Você colocou tudo no livro ou algumas coisas ficaram de fora?
TV – Não reconheço nada que tenha ficado de fora. Tudo na real, como tem que ser.

MaisPB – Depois da morte de Melodia, o artista Pedro Luiz gravou um disco em sua homenagem, inclusive com uma canção inédita cedida por Jane…
TV – Eu acompanhei pouco essa participação do Pedro Luiz, apenas ouvi em algum lugar as músicas cantadas por ele.

MaisPB – Tem planos novos para depois da pandemia?
TV – Ainda nada definido. A pandemia exige cautela, pouca movimentação. Ainda estou conversando com a minha editora, Tordesilhas de SP.

MaisPB – Aliás, o livro foi lançado em plena pandemia?
TV – O lançamento oficial estava marcado quando – dez dias antes – surgiu a pandemia. O lançamento teve que ser virtual e dentro de uma nova realidade do mercado. Ainda estamos nos adaptando.

MaisPB – Como você tem visto o Brasil, com o atual governo?
TV – Bem, eu sou anti-Bolsonaro, nem um pouco negacionista e aguardo na fila para me vacinar, seja qual for a origem do remédio. Tenho certeza que não é uma “gripezinha”.

MaisPB

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