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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Sombras

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publicado em 02/11/2021 às 09h29
atualizado em 02/11/2021 às 06h46


(para Jória Guerreiro)

Walter Galvão, Martinho Moreira Franco, Marcos Tavares, Wellington Pereira, Carmen e José Carlos Teixeira, Fred Pitanga, Eduardo Carneiro, Marcelo Câmara, Marcelo Figueiredo, Ozildo Paulino, Toni Pegado, Jefferson Araújo, Heitor Cabral, Penha Marques, Zé Maranhão, Vasco de Ecila, Lena Guimarães, Adelson Barbosa e minha prima Fafá, uns de Covid, outros não. E muito mais.

A dor de cada família, a dor que se instalou, uma cena para sempre. Ou banal, como um animal a procurar a posição para dormir, depois apanha-nos devagar, lenta, em surdina, a dor da ausência.

A dor tem consequências imensas, estranhas e improváveis, quase degradantes. Só sabe quem perdeu.

Há uma tristeza associada, uma morte anunciada, uma certeza cruel, sombras, cinzas e lembranças.

E não há qualquer espécie de compaixão ou vontade de conviver com a ausência, se acostumar com as perdas, este papel de vítima da dor, a minha dor, a que fica no corpo, a única, a que mais dilacera, em que penso ser paralisante de tudo o resto.

Eu olho a cidade e não vejo mais as pessoas, vivas ou mortas.

Como já se disse, a dor não tem princípio. A dor martela, diante de tantos dias, um atrás do outro e uma madrugada no meio.

É muito solitário estar nesta situação de igual para igual a ver seus parentes enterrados ou cremados, quando não há mais despedidas, dignas e decência.

Não sei o que vim escrever aqui hoje. Juro. Só consigo imaginar daí em diante, uma sequência com sequelas.

Cruzo e descruzo os braços, abraços, para me proteger, para ajudar, colar na dor daqueles que ficaram, que queriam usufruir o último momento e que querem viver mais ao invés de sobreviver.

Toda alegria exposta nas fotografias, as roupas que foram doadas para vestir outros corpos. Nós, como moldura dessa composição, dessa aflição.

E eu lembro deles, os ausentes, uma sombra, uma saudade danada, apenas mais uma vez e saber que muitos perderam a guerra para o coronavírus.

Jota, Pedro, Anita, Mariquinha, Tonha, Antonio, Cecilia, Valter, Luiz, Aparecida, Dinha, Paulo, Francisco, Zezinho, Luiza, tantos desconhecidos que bateram asas antecipadas.

Kapetadas

1 – A inércia traiu o movimento.

2 – Quando até as armas cenográficas matam, a situação está pra lá de dramática.

3 – Som na caixa: “Morrer ainda é aqui, na vida, no sol, no ar”,. Gilberto Gil

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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