João Pessoa, 23 de março de 2015 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora
entrevista

“Quem governa o Brasil é o Renan e o Cunha”, diz Aécio Neves

Comentários: 0
publicado em 23/03/2015 às 11h48
atualizado em 23/03/2015 às 12h05
Senador Aécio Neves, do PSDB-MG

Principal nome da oposição, o presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, diz que Dilma Rousseff perdeu o controle do governo e que o PT defende apenas os interesses do partido e não dos brasileiros. Segundo o tucano, quem governa o Brasil é Renan Calheiros (presidente do Senado) e Eduardo Cunha (Presidente da Câmara), ambos do PMDB.

No final da campanha eleitoral do ano passado, quando esteve perto de derrotar a presidente Dilma Rousseff, o senador Aécio Neves se mostrava orgulhoso por ter reencontrado multidões nas ruas, sensação que não tinha desde a mobilização das Diretas Já, em 1984. No dia 15 de março, Aécio acompanhou o gigantesco protesto contra Dilma da janela de seu apartamento no Rio – e surpreendeu-se mais uma vez com a força popular. “O que aumenta o distanciamento entre a sociedade e a presidente é a sensação do engodo”, afirma Aécio, referindo-se às medidas tomadas pelo governo que contrariam o discurso de campanha de Dilma.

O senador mineiro acompanha com atenção os confrontos entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional. “A presidente ainda não sabe, mas hoje quem governa o Brasil é o Renan Calheiros e o Eduardo Cunha”, afirma Aécio, referindo-se aos presidentes do Senado e da Câmara, respectivamente. Nesta entrevista, o parlamentar diz que ainda não há elementos para o impeachment, mas é mordaz na avaliação do trabalho de Dilma: “Este governo terminou antes de começar.”

Multidões protestam contra o governo, as investigações da Lava Jato trazem novas revelações todos os dias e o ministro da Educação, Cid Gomes, foi demitido depois de dizer que mais de 300 parlamentares são achacadores. O que está acontecendo com o Brasil?

AÉCIO NEVES –

Este governo terminou antes de começar. O Brasil hoje tem um interventor na economia (o ministro da Fazenda, Joaquim Levy), de quem a presidente Dilma é dependente. Ele cumpre uma agenda que não é aquela proposta pela presidente da República durante a campanha. Do ponto de vista político-administrativo, nós vivemos no parlamentarismo. A presidente não sabe ainda, mas quem governa o Brasil hoje é Renan Calheiros, na presidência do Senado, e Eduardo Cunha, na Câmara dos Deputados. E olha que esses são personagens que vivem um momento delicado. Enquanto isso, os indicadores econômicos se deterioram, as denúncias de corrupção cada vez chegam mais próximas da cúpula do PT e dos beneficiários dessa grande organização criminosa, como nomeia a Polícia Federal, que se instalou na Petrobras e sabe-se lá onde mais.

ISTOÉ –

Qual é a saída para a crise?

AÉCIO NEVES –

O que aumenta o distanciamento entre a sociedade e a presidente é a sensação de engodo. A mentira que conduziu a campanha da presidente Dilma, agora mostrada em todas as suas cores à população, aumenta o sentimento de indignação que já tinha razões objetivas para existir com a corrupção, o desacerto na economia, o aumento nas contas de luz e nos combustíveis. Sempre que teve que optar entre o Brasil e o PT, o partido ficou com o PT.

ISTOÉ –

Qual é o papel de Eduardo Cunha neste cenário de crise?

AÉCIO NEVES –

Eduardo inegavelmente assumiu uma liderança na Câmara dos Deputados, expressa na sua eleição em primeiro turno. Mas eu o vejo, ainda, apesar de todos esses percalços, como um líder do PMDB, um partido aliado do governo. O PMDB participa de forma muito expressiva do governo. Nós temos de fazer nosso papel e a oposição o tem feito de forma extremamente competente e vigorosa.

ISTOÉ –

O senhor tem exemplos disso?

AÉCIO NEVES –

Vou citar quatro exemplos. Foi assim na eleição de Tancredo Neves para presidente, que pôs fim ao ciclo autoritário. O PT expulsou os parlamentares que votaram em Tancredo. Depois, o PT se negou a apoiar a Constituição de 1988 (o partido se recusou a participar da homologação coletiva da Constituição). No governo de Itamar Franco, de conciliação nacional, o PT afastou Luíza Erundina por ter aceitado ser ministra. Por último, no Plano Real, o PT atrapalhou como pôde.

ISTOÉ –

O senhor defende o impeachment da presidente Dilma?

AÉCIO NEVES –

Essa não é a agenda do PSDB. O impeachment precisa de alguns componentes que ainda não se colocaram. Mas não podemos tapar o sol com a peneira. Essa não é uma palavra proibida. O impeachment é uma previsão constitucional e setores da sociedade falam abertamente nisso. Não dá para acreditar que o governo quer enfrentar a corrupção se aceita que o tesoureiro do partido da presidente, investigado pelo Ministério Público, com indícios graves de recebimento de propina, continue no cargo. O Brasil e o governo vivem uma crise de credibilidade.

ISTOÉ –

Como se explica a demissão do ministro Cid Gomes?

AÉCIO NEVES –

Esse é um fato inédito e mostra, claramente, o descontrole do governo. Depois do enfrentamento público, pessoal, com o presidente da Câmara dos Deputados , o ministro obviamente perdeu as condições de ficar no governo. O que fica disso é a sensação de que não há governo, que o descontrole é absoluto. Mas houve outro fato extremamente grave nesta semana no governo.

ISTOÉ –

Qual?

AÉCIO NEVES –

O documento, vazado de dentro do Palácio do Planalto, que atesta que o governo cometeu crime durante a eleição. Confirma que robôs financiados pelo governo foram usados para fazer campanha para a presidente Dilma. É a velha dificuldade do PT de separar o que é público, do que é partidário e do que é privado. Mostra que os critérios de distribuição de verba pública levam em conta, em grande parte, a vinculação ideológica e política. O documento é atribuído ao ministro Thomas Traumann (da Secretaria de Comunicação Social). Ele será convocado para vir ao Senado e à Câmara. Ao mesmo tempo, estamos entrando com um ação pública contra o ministro e uma ação de improbidade administrativa na procuradoria da República do Distrito Federal.

ISTOÉ –

Qual será a agenda do PSDB nos próximos meses?

AÉCIO NEVES –

Queremos avançar em alguns temas da reforma política no Congresso. Posso antecipar algumas: fim da reeleição, com mandatos coincidentes de cinco anos para todos os cargos majoritários; cláusula de barreira, para que os partidos voltem a ter conexão com setores da sociedade e não sejam apenas legendas a serviço de interesses menores. Não é razoável que nós tenhamos no Congresso 28 partidos funcionando. Defendemos também o voto distrital misto que, na visão do PSDB, parece ser o caminho mais adequado para aproximarmos um pouco mais a sociedade dos seus representantes.

ISTOÉ –

Quer dizer que a agenda prioritária do PSDB será a reforma política?

AÉCIO NEVES –

Claro que não. Temos também a agenda anticorrupção. Nesse aspecto, o governo requenta propostas, apresenta projetos que tramitam no Congresso, algumas até já em fase final de aprovação. Ontem (quarta-feira, 18), apresentamos na Câmara dos Deputados uma proposta que cassa o registro dos partidos políticos que, comprovadamente, tenham recebido dinheiro de corrupção em seu caixa partidário ou nas campanhas eleitorais. Estou falando inclusive de caixa 1 com dinheiro ilícito. Hoje existe essa possibilidade para partidos que recebem dinheiro do exterior. Eu gostaria que o primeiro apoio a essa proposta fosse do PT.

ISTOÉ –

O PT anunciou que vai pedir ao STF a abertura de uma investigação contra o senhor, com base nas investigações da Lava Jato, sobre desvio de dinheiro de Furnas. Qual é sua opinião sobre isso?

AÉCIO NEVES –

Abram todas as investigações. Ninguém no Brasil foi tão investigado como eu, que sou adversário frontal do PT. Eu recebi um atestado de idoneidade de todos os órgãos públicos. Na verdade, isso é uma ação de um deputado estadual de Minas Gerais (Rogério Correia, do PT) que busca um pouco de publicidade para a sua atuação.

ISTOÉ –

O senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), que pertence ao seu grupo político, também está na lista de investigados. Qual é a dimensão desse problema para o PSDB?

AÉCIO NEVES –

É uma grande injustiça. Eu tenho absoluta convicção que o senador Anastasia será o primeiro inocentado. A investigação em relação a ele é a única que não vem das delações premiadas. Tem como base o depoimento de um ex-policial federal que disse ter entregue dinheiro para alguém em Minas Gerais que se parecia com uma fotografia do Anastasia. Imagina, ele não era apenas um candidato, já era governador de Minas Gerais. A história é tão sem pé nem cabeça que não se sustenta. Já há uma afirmação do advogado de quem seria o “mandante” desse dinheiro, de que jamais enviou dinheiro para o Anastasia.

ISTOÉ –

Alguns setores do PT dizem que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é “tucano”. O que o senhor acha da atual política econômica?

AÉCIO NEVES –

Joaquim Levy é um homem de bem. Agora, o ajuste fiscal proposto por ele, que se sustenta no aumento da carga tributária e na supressão de direitos trabalhistas, não seria o ajuste do PSDB. Na verdade, não se mexeu até agora na questão estrutural. Não se discutiu, por exemplo, a profissionalização das agências reguladoras, para que elas sejam realmente instrumentos do Estado, estimuladoras do investimento privado. Tivemos uma redução de 8% no investimento privado no último ano. Fevereiro foi o pior mês em geração de empregos com carteira assinada dos últimos quinze anos. A inflação já beira os 8%. Onde está o governo?

Leia Também