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Médico fala das péssimas condições de trabalho

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publicado em 16/05/2018 às 16h05
atualizado em 16/05/2018 às 13h13

O médico Aurédio José do Couto, de 71 anos, que teve um ataque de fúria em uma unidade de saúde de Cariacica, no Espírito Santo, falou sobre as más condições do local. Sem saber que estava suspenso pela prefeitura, ele voltou ao local para trabalhar, mas foi para casa após ser comunicado que não tinha pacientes agendados.

“Eu entro na minha sala e não tem um termômetro para ver a temperatura, não tem um estetoscópio para escutar o pulmão […]. Se eu quiser examinar a sua amídala, eu tenho que comprar um picolé e tirar o palito para examinar”, disse.

Aurédio soube da suspensão pelas equipes de reportagem que o aguardavam na unidade de saúde. “Isso é verdade? Eu não recebi nenhum documento até agora. Vim atender os pacientes e estou aqui esperando eles falarem qual a sala eu vou atender”, afirmou.

O surto ocorreu nesta terça-feira (15) e foi gravado por um paciente que aguardava uma consulta. Auréio derrubou móveis e jogou documentos no chão, na unidade de saúde do bairro Jardim América (veja acima).

Segundo a Polícia Civil, foram quebradas duas cadeiras de plástico e duas gavetas. O delegado André Luiz Landeira disse que o caso configura dano contra o patrimônio público e o médico será intimado a depor.

A Prefeitura de Cariacica foi procurada pelo G1, na manhã desta quarta, para comentar a volta do médico ao trabalho, mas ainda não se posicionou sobre o assunto.

O que motivou o senhor a agir daquela maneira?

Aurédio José do Couto – Eu fui procurar inicialmente a sala que eu iria atender, como eu vim agora, para cumprir o meu contrato, que eu tenho desde 1971 com a prefeitura. Se eu não vier, eles cortam meu dia. Eu tenho que pedir que eles distribuam fichas para os meus pacientes. Falam aí até que eu morri. Muitos pacientes reclamam porque eu ressuscitei, eles fizeram muitas orações para mim que tinha morrido, porque a portaria, onde distribui ficha, fala que eu não estou aqui mais. Mesmo que eles me mandem embora, mesmo que eles não me deixem trabalhar mais, eu vou estar sempre aqui.

O senhor está arrependido?

Aurédio – Eu acho que a população está aprendendo como fazer as coisas. Você vai lá tirar uma ficha hoje e você vai ver o tratamento que é dado. Eu entro na minha sala e não tem um termômetro para ver a temperatura, não tem um estetoscópio para escutar o pulmão, um aparelho para medir pressão. Se eu quiser examinar a sua amídala, eu tenho que comprar um picolé e tirar o palito para examinar. Eu queria que você fosse na sala onde me puseram.

O senhor se revoltou por causa das condições de trabalho?

Aurédio – Não sei. Eu acho que o mais pesado disso tudo foram as cadeiras, coitadinhas delas, elas não tinham nada com isso. Elas estão aí talvez até para sentar algumas pessoas. Mas os bancos para os pacientes sentarem enquanto aguardam as fichas ali, eles não olham. As pessoas que vêm de madrugada para pegar ficha, como eles ficam? Ontem choveu e tinha tanta gente molhada ali. Será que eles olham isso?

O que o senhor avalia a sua suspensão?

Aurédio – Quem sou eu para fazer uma auto definição sobre esse ato. Eu acho que eles têm que colocar a mão na consciência e falar para mim pessoalmente essas coisas. Eu procurei a secretária de saúde há uns meses para poder falar da situação dessa unidade básica de saúde, básica. Olha, é a base da saúde de Cariacica.

O senhor faria novamente?

Aurédio – Não. Agora, eu tenho pessoas que vão me ajudar, porque não tem mais cadeiras, eu derrubei algumas, mas a raiva que eu tive eu não descontei na população. A população estava lá me defendendo, mandando eu fazer mais. Eu não sou nenhuma criança, eu tenho 46 anos de medicina, será que eu mereço isso? Será que a população merece isso? Eu nem penso em mim. Esse enfrentamento não vai acabar agora. Mesmo que eles me tirem daqui, eu vou continuar a minha luta.

A polícia disse que o senhor vai ser chamado para depor. Está fazendo alguma preparação?

Aurédio – Eu não preciso de preparação, eu tenho aqui um manuscrito para o que eu vou falar com ele [o delegado] o que falta aqui.

O que diz a prefeitura

A secretária municipal de Saúde, Stéfane Legran, disse que o gatilho para o surto do servidor está sendo apurado.

No mesmo dia da confusão, Stéfane afirmou que o médico vai ficar suspenso até que os fatos sejam esclarecidos. A princípio, o médico estaria insatisfeito com as instalações da unidade, que passa por reformas.

“Com o passar dos anos, a oferta de serviço foi aumentando cada vez mais. Essa unidade passa por um momento de reforma. Uma pessoa nessa idade, acostumada com a rotina, teve um descontentamento”, disse a secretária.

Conforme verificado pela reportagem, a sala em que o médico atendia nos últimos dias estava sem energia elétrica e com equipamentos sucateados. Aurédio, então, foi remanejado para outra sala, que ficava ao lado de uma obra.

Carreira

O médico atua há 47 anos no serviço de saúde municipal e ajudou na construção do local. Segundo o Sindicato dos Médicos, ele chegou a atender até na cozinha da unidade. Questionada, a prefeitura respondeu que não tem conhecimento do fato.

Precariedade

O presidente do Sindicato dos Médicos do Espírito Santo (Simes), Otto Baptista, afirmou que na unidade de saúde não está adequada para atender dignamente a população.

“O que aconteceu em Cariacica é um espelho do que vem acontecendo de Norte a Sul do estado, uma carência nas unidades básicas dos municípios. A gente não enxerga que ele depredou o patrimônio. Foi um desabafo”, declarou Otto.

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