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corrupção no Exército

MP detecta desvios de R$ 191 mi nas Forças Armadas

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publicado em 22/10/2017 às 10h27
atualizado em 22/10/2017 às 16h07

Em setembro deste ano, o general do Exército Antonio Hamilton Mourão discursava com autoridade. A uma plateia atenta, ele se mostrava incomodado com a corrupção que atinge o país e disse que os militares estariam dispostos a executar uma intervenção se o Judiciário não “resolver o problema político”, numa alusão a políticos corruptos.

O discurso de Mourão causou polêmica e refletia a tese propagada por grupos que defendem uma eventual intervenção militar de que as Forças Armadas estariam “imunes” à corrupção e, portanto, poderiam dar um fim à crise política vivida pelo país nos últimos anos.

Investigações conduzidas pelo MPM (Ministério Público Militar) e um levantamento inédito do STM (Superior Tribunal Militar) feito a pedido do site UOL mostram, porém, que, assim como as demais instituições brasileiras, as Forças Armadas também sofrem com os casos de corrupção.

Denúncias feitas pelo MPM apontam para desvios milionários praticados tanto por praças quanto por oficiais de alta patente. Os casos vão de cobrança de propina em contratos a roubo de peças de tanques militares. Nas informações recebidas pelo site UOL e veiculadas na Imprensa são evidenciados que mais de uma centena de militares já foi condenada por crimes como esses entre 2010 e 2017 e que a falta de transparência no controle dos gastos pode criar o ambiente perfeito para que a corrupção se propague.

“Corrupção, peculato e estelionato”

O MPM (Ministério Público Militar) identificou, nos últimos dez anos, desvios de pelo menos R$ 191 milhões nas Forças Armadas. Boa parte deste valor é resultado de crimes como fraudes a licitações, corrupção passiva, ativa, peculato e estelionato. O valor é resultado de um levantamento feito pelo UOL com base em informações repassadas pelo MPM.

Procurado pela reportagem, o Ministério da Defesa diz fazer auditorias para a avaliação dos gastos das Forças Armadas, que “nenhuma organização ou país está imune à corrupção” e que “na formação e educação do militar, fatos desabonadores da ética e da moral são repudiados e devidamente punidos”.

O levantamento tem como base um conjunto de 60 denúncias feitas pelo MPM e mostra que a corrupção não apenas existe nas Forças Armadas, mas que ela é praticada tanto por praças (cabos e soldados) quanto por oficiais de alta patente, a elite entre os militares.

O MPM é um braço do Ministério Público Federal especializado na apuração de crimes cometidos por militares ou civis contra as Forças Armadas. Seus promotores e procuradores são civis, embora alguns deles já tenham tido carreira militar.

Das 60 denúncias, 59 foram encaminhadas ao TCU (Tribunal de Contas da União) em meados de setembro. O encaminhamento foi feito a pedido do tribunal como parte dos procedimentos de controle das contas das Forças Armadas. O órgão é um dos responsáveis pela análise das contas públicas das Forças Armadas. A que ainda não foi encaminhada ao TCU ainda está sob sigilo e aguarda uma decisão da Justiça Militar para se transformar em ação penal.

Corrupção militar semelhante à corrupção civil

A análise dos dados extraídos das denúncias oferecidas pelo MPM permite dizer que o perfil dos casos de corrupção nas Forças Armadas é semelhante ao de outras instituições públicas civis.

Há desvios causados por crimes como fraudes a licitações em hospitais militares, pagamento indevido de diárias a oficiais da Aeronáutica, desvio de combustíveis e apropriação de dinheiro público.

Há, também, casos típicos de uma organização militar como o de soldados que roubaram peças de um tanque de guerra no Sul do país para vendê-las a um ferro-velho e o de um coronel do Exército reformado que, às vésperas de sua morte, se divorciou de sua mulher e se casou com a de seu próprio filho apenas para garantir que a sua pensão fosse paga por mais tempo.

O MPM criou, em novembro do ano passado, um núcleo de apoio ao combate à corrupção. Sediada em Brasília, esta unidade fornece treinamento e apoio técnico-logístico para promotores militares espalhados pelo Brasil.

Para o procurador-geral da Justiça Militar, Jaime Cassio de Miranda, as Forças Armadas estão, como qualquer outra instituição, sujeitas à corrupção.

“As Forças Armadas não estão imunes à corrupção. O crime existe. Tanto existe que nós (MPM) estamos aqui”, afirmou.

O procurador pondera, no entanto, que, apesar de as investigações já terem encontrado organizações criminosas formadas por militares atuando em unidades do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, ele diz não acreditar que a corrupção seja sistemática na instituição.

“A gente já encontrou pessoas atuando juntas em organizações militares com o objetivo de desviar recursos públicos, mas, até agora, não há nenhum indício de que isso ocorra de forma sistemática nas Forças Armadas. Pelo menos, não até agora”, disse o procurador.

O secretário de Controle Interno do Ministério da Defesa, André de Sena Paiva, afirma que não há como afirmar que as Forças Armadas estão imunes à corrupção. “As Forças Armadas são integradas por parcela representativa da sociedade. Nenhuma organização ou país está imune à corrupção”, afirmou.

Paiva diz ainda que “na formação e educação do militar, fato desabonadores da ética e da moral são repudiados e devidamente punidos”.

132 militares condenados

Levantamento inédito feito com dados fornecidos pelo STM (Superior Tribunal Militar) a pedido do UOL mostra que, entre 2010 e 2017, 132 militares das Forças Armadas foram condenados pela Justiça Militar pelos crimes de corrupção passiva, corrupção ativa ou peculato, o equivalente a 0,04% do contingente total das Forças Armadas, estimado em 334 mil pessoas. Outros 299 militares ainda aguardam julgamento. Nesse período, pelo menos 12 oficiais foram expulsos e perderam seus postos e patentes por crimes ligados a desvios de recursos públicos das Forças Armadas.

O levantamento feito pelo UOL utilizou dados fornecidos pelo STM referentes a todos os processos que tramitaram ou tramitam na primeira e na segunda instâncias da Justiça Militar entre 2010 e agosto de 2017. Este levantamento, porém, não permite diferenciar os militares entre praças (soldados, cabos e sargentos, por exemplo) e oficiais.

Na maioria dos casos, quando um militar do Exército, Marinha ou Aeronáutica comete um crime, ele é investigado pelas próprias Forças Armadas, que instauram um IPM (Inquérito Policial Militar).

Se forem encontrados indícios de que o praça ou oficial cometeu um crime, esse inquérito é remetido ao MPM (Ministério Público Militar), a quem cabe oferecer a denúncia à Justiça Militar ou não. No MPM, os promotores e procuradores são todos civis. Na Justiça Militar, os julgamentos são feitos por juízes civis e militares.

A Justiça Militar tem duas instâncias. Se o réu for condenado na primeira, chamada de “Auditoria Militar”, ele ainda pode recorrer à segunda instância, o STM, cuja sede fica em Brasília.

Em setembro deste ano, por exemplo, um coronel do Exército foi condenado a cinco anos de prisão pelo STM por peculato (apropriação de dinheiro ou recurso público em decorrência do cargo que exerce) no caso que investigava desvios de verba pública para obras de recuperação da rodovia BR-163, que corta o Centro-Oeste e parte da região Norte.

Os promotores identificaram desvios de R$ 4 milhões. O coronel foi acusado e condenado por ter liberado o pagamento de recursos às empreiteiras contratadas pelo Exército sem que as obras tivessem sido efetivamente concluídas. Ele havia sido condenado em primeira instância, recorreu e agora teve sua pena confirmada pelo STM.

A perda de posto e patente é uma das penas mais temidas pelos militares. Ela acarreta na expulsão do militar das Forças Armadas e, em geral, na perda dos vencimentos do militar.

Pela legislação, há dois caminhos para que um militar perca o posto e a sua patente. Um deles é a chamada declaração de indignidade. Quando um oficial é condenado (com sentença transitada em julgado –ou seja, não cabe mais recurso) a uma pena acima de dois anos de prisão, o MPM move uma ação pedindo a perda do posto e da patente por considerá-lo “indigno” de continuar nas Forças Armadas. Essa ação precisa ser julgada pelo STM.

Em geral, a Corte segue o entendimento de que, por ter sido condenado em segunda instância, o oficial não é mais digno para continuar na corporação. Há situações, porém, em que mesmo condenado, os juízes do STM decidem manter a patente e o posto do militar.

“Pode acontecer de um militar ser condenado em primeira e segunda instância, mas ainda assim ser considerado apto a continuar no cargo após o cumprimento da pena. Esses casos são raros, mas existem”, afirmou uma fonte ouvida pela reportagem do UOL que pediu para não se identificar.

O outro caminho para um militar ser expulso da corporação é o Conselho de Justificação. Neste caso, mais aplicado para expulsar militares com problemas disciplinares, não é preciso haver uma condenação criminal para que o oficial seja submetido à avaliação dos magistrados.

Questionada pela reportagem do UOL sobre a quantidade de militares expulsos nos últimos cinco anos em razão dos seus envolvimentos em crimes de corrupção, a de Secretaria de Controle Interno do Ministério da Defesa disse que a “execução dos processos disciplinares não é de competência” do órgão.

132
É o número de militares condenados entre 2010 e 2017 por crimes como corrupção ativa, passiva e peculato

299
É a quantidade de militares que respondem por esses mesmos crimes e que ainda aguardam julgamento

R$ 191 milhões
É o valor somado dos desvios acima de R$ 100 mil detectados pelo MPM entre 2014 e 2017

334 mil
É o efetivo estimado das Forças Armadas, incluindo Exército, Aeronáutica e Marinha

“Roubo em tanque de guerra”

A análise das 59 denúncias feitas pelo MPM (Ministério Público Militar) relacionadas a desvios acima de R$ 100 mil permite identificar que a corrupção nas Forças Armadas, assim como no ambiente civil, acontece de diferentes formas. Vai de fraude a hospital a roubo de peças de tanque de guerra.

No dia 16 de outubro, a Justiça Militar, em primeira instância, recebeu uma denúncia contra um major da reserva do Exército e um empresário por fraudes ao serviço de assistência médico-hospitalar oferecido a militares e seus familiares.

Segundo a denúncia, o major responsável pela licitação que contrataria uma empresa para prestar o serviço de atendimento médico domiciliar burlou o certame realizado em 2008. De acordo com os promotores, o militar fraudou o sistema de compras eletrônicas do Exército para favorecer uma das empresas que participavam do pregão.

As outras empresas que disputavam a licitação recorreram da decisão, mas o militar rejeitou todos os recursos. Mais tarde, o mesmo militar que organizou o certame assinou o contrato com a empresa vencedora, o que contraria a legislação que regulamenta os pregões eletrônicos.

Os promotores constataram que, apesar de a empresa vencedora ter recebido R$ 1,7 milhão pelos contratos, ela não atendeu a nenhum paciente. O contrato só foi rescindido depois que as Forças Armadas trocaram o responsável pelo ordenamento das despesas do setor.

O major, que agora está na reserva, é réu juntamente com outros dois empresários que, segundo os promotores, participaram da fraude.

Nem tanque de guerra escapou

Um dos casos mais curiosos apurados pelo MPM aconteceu em 2015, na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. Lá, fica sediada o 3º Grupo de Artilharia de Campanha, formado por veículos blindados, entre eles, tanques de guerra do tipo M108.

Em dezembro daquele ano, um soldado e um cabo furtaram diversas peças dos tanques M108 que fazem parte do grupamento e as venderam para uma oficina. No total, as peças incluíam portas traseiras, tampas e outros equipamentos dos blindados que pesavam em torno de 320 quilos. Peças que, no mercado internacional, custariam mais de R$ 100 mil, foram vendidas por R$ 912,50.

O crime foi tão amador que as câmeras do circuito de vigilância do quartel e da própria oficina onde as peças foram entregues registraram toda a ação. O caso ainda não foi julgado pela Justiça Militar.

Coronel casa com nora para garantir pensão

Outro caso envolvendo militares de alta patente é o de um coronel reformado do Exército de 85 anos de idade que se divorciou de sua esposa e se casou com a mulher de seu filho para garantir o pagamento de sua pensão por mais tempo.

Segundo a denúncia, o caso aconteceu na cidade de São Francisco de Assis, no interior do Rio Grande do Sul. Em 2006, o coronel foi diagnosticado com leucemia linfócita crônica.

Em julho de 2008, com 85 anos de idade, ele se divorciou. Dois meses depois, em setembro, ele se casou com a mulher de seu filho. O detalhe é que os dois casais moravam na mesma casa.

Em outubro de 2009, o coronel morreu e sua nova mulher passou a receber uma pensão estimada em R$ 15, 7 mil.

Os promotores alegam que o casamento do coronel com a nora não foi um caso de amor arrebatador, mas um plano executado em várias etapas para fraudar o sistema de pagamento de pensões militares.

Entre 2009 e 2012, quando a fraude foi descoberta, o prejuízo aos cofres públicos foi de R$ 533 mil. Com a morte do coronel, restou ao MPM processar o filho e a mulher (a segunda) do militar reformado, ambos civis. O caso ainda aguarda julgamento pela Justiça Militar.

Perfil dos corruptos de farda

Embora não haja um levantamento sistemático sobre a proporção de oficiais e praças investigados e condenados por corrupção nas Forças Armadas, o coordenador do núcleo de combate a esse tipo de crime no MPM, Luiz Felipe Carvalho Silva, diz acreditar que militares temporários estejam mais propensos a praticar crimes de corrupção do que os de carreira.

“A gente observa que existe uma matriz de risco maior em relação aos militares temporários, que fazem concurso e passam alguns anos nas Forças Armadas, do que em relação aos oficiais de carreira”, afirmou o promotor.

Segundo ele, alguns militares temporários “não incorporam o espírito do oficial de carreira” e ficam mais sujeitos a esse tipo de crime. “Não é que não exista oficiais de carreira que pratiquem atos de corrupção. A gente só verifica que há um risco maior naqueles que não são de carreira”, afirma o promotor.

Questionado pela reportagem do UOL, o Ministério da Defesa disse que, quando identifica casos com indícios de irregularidades com prejuízo ao erário, o órgão toma as providências necessárias e previstas em lei.

“Nos casos em que são constatados atos ou fatos ilegais ou irregulares, são expedidas recomendações aos dirigentes para que seja efetuada a competente apuração por meio de procedimentos disciplinares”, disse o ministério.

O órgão diz ainda que “nas situações em que é identificada a ocorrência de dano ao erário, é recomendada a aplicação de medidas administrativas para ressarcimento do dano, tais como a abertura de Tomada de Contas Especial” e que as recomendações “são submetidas aos órgãos externos competentes, a exemplo do Tribunal de Contas da União”.

“Falta polícia judiciária especializada”

A falta de uma polícia judiciária militar especializada dificulta a apuração de crimes como os de corrupção nas Forças Armadas. A afirmação é do Procurador-Geral da Justiça Militar, Jaime Cassio Miranda. Segundo ele, se Exército, Aeronáutica e Marinha tivessem uma polícia judiciária específica, o trabalho do MPM (Ministério Público Militar) seria mais fácil.

Nas Forças Armadas, os crimes militares são investigados, inicialmente, pelos próprios militares. Quando há suspeitas de que um crime foi cometido, um militar, geralmente um oficial, é designado para atuar como se fosse uma espécie de delegado e investigar o caso. Esse militar vai chefiar o chamado “inquérito policial militar”.

É esse inquérito que será encaminhado ao MPM, formado por civis, e que poderá servir de base para uma denúncia ou não. Assim como em uma investigação civil, quanto melhor for o inquérito, mais sólida e robusta deverá ser a denúncia. As Forças Armadas deslocam oficiais para chefiar inquéritos porque elas não têm uma polícia judiciária. Polícia judiciária é aquela responsável por fazer investigações criminais, como as polícias civis nos Estados e a Polícia Federal em âmbito nacional.

O problema, diz Miranda, é que os militares encarregados de conduzir os inquéritos não têm a formação específica para atuar dessa forma e isso dificulta o trabalho dos promotores e procuradores do MPM.

“Se tivéssemos uma polícia judiciária especializada dentro das Forças Armadas, isso facilitaria a qualidade do inquérito que a gente recebe. Isso seria melhor não apenas para os crimes de corrupção, mas de todos”, disse o procurador-geral.

O coordenador do núcleo de combate à corrupção do MPM, Luiz Felipe Carvalho Silva, explica a origem do problema.

“O militar que vai comandar um inquérito policial militar é treinado para ser soldado, para ser militar, não para investigar. E aí ele acaba se vendo como um delegado de polícia e algumas vezes se sente perdido”, afirma.

Luiz Felipe Carvalho diz que os promotores e promotoras tentam mitigar a falta de especialização de quem conduz os inquéritos acompanhando, mais de perto, a condução das investigações.

Procurada pela reportagem do UOL, a Secretaria de Controle Interno do Ministério da Defesa disse que não é sua competência “determinar a estrutura que vai tratar dos inquéritos policiais militares nem comentar afirmações de outro órgão”.

Investigação contra militares usa ferramentas da Lava Jato

Luiz Felipe Carvalho, que coordena o núcleo de combate à corrupção do MPM, diz que o órgão tem investido, nos últimos anos, em ferramentas utilizadas pela Operação Lava Jato para combater esse tipo de crime entre os militares.

Ele diz que, assim como no ambiente civil, os crimes de corrupção entre os militares estão ocorrendo de forma mais sofisticada e que isso obriga o MPM a usar tecnologia mais modernas.

Um exemplo é uso de softwares de análise de sigilo bancário e fiscal semelhantes aos usados pela Operação Lava Jato para rastrear o chamado “caminho do dinheiro”.

“A gente tem percebido que houve uma certa sofisticação nos crimes de corrupção que ocorrem dentro das Forças Armadas. Antes, era mais fácil mapear de onde saía e para onde ia o dinheiro. Hoje, a gente tem a mesma tecnologia para análise de dados que a Operação Lava Jato”, diz Luiz Felipe.

Para o subprocurador-geral do MPM, Clauro Bortolli, essas novas tecnologias estão ajudando o órgão a conseguir mais condenações.

“Antes, há uns 20 anos, para você conseguir uma condenação por corrupção na Justiça Militar, só se fosse a fórceps. Hoje, essas técnicas te permitem produzir provas mais robustas. Por isso, estamos conseguindo mais condenações”, afirmou.

Bortolli diz não acreditar que haja corporativismo entre os juízes e juízas militares e os réus, mas ele disse ser mais difícil convencer um magistrado de que um determinado oficial tenha praticado um crime de corrupção.

“Ainda existe uma certa resistência dos juízes em considerar que um militar é corrupto. Tem toda uma questão da reputação do oficial, esse tipo de coisa. Mas, no momento em que a gente consegue convencê-los com provas robustas, eles não perdoam”, diz o subprocurador-geral.

Menos abertura, mais corrupção

Donas de orçamentos bilionários, as Forças Armadas ainda são pouco transparentes no quesito prestação de contas e essa baixa “transparência” pode ensejar casos de corrupção. A análise é do consultor sênior da Transparência Internacional no Brasil, Fabiano Angélico. Segundo ele, ainda que alguns gastos das Forças Armadas devam ser protegidos pelo sigilo, o número reduzido de instrumentos de controle propicia casos de corrupção na instituição. “Quanto menos abertura, mais corrupção”, diz Angélico.

Em 2016, o Ministério da Defesa teve um orçamento de R$ 81 bilhões, o quarto maior da União. Sua fatia no “bolo” orçamentário foi quase duas vezes o total destinado pelo governo ao Ministério da Saúde (R$ 43 bilhões).

Apesar do orçamento bilionário, as Forças Armadas, assim como o Ministério das Relações Exteriores e a Presidência da República, não têm suas contas auditadas pelo Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, um dos principais órgãos do Poder Executivo no combate à corrupção.

A legislação que criou a CGU, há mais de dez anos, impede que esses três órgãos sejam fiscalizados pelo órgão. A justificativa é a de que os três lidam com dados sensíveis e ligados à segurança nacional.

O controle sobre as contas das Forças Armadas é feito pela Ciset (Secretaria de Controle Interno) do Ministério da Defesa, um órgão sob a supervisão da CGU, mas não subordinado a ela.

A secretaria audita os gastos e, quando encontra irregularidades, repassa essas informações a órgãos de controle externo como o TCU (Tribunal de Contas da União). Atualmente, o Ministério da Defesa tem uma equipe de 25 pessoas, entre civis e militares, para fiscalizar os bilhões de reais de seu orçamento.

Para Fabiano Angélico, o argumento de que as Forças Armadas lidam com informação sensível é válido, mas há informações sobre os gastos dos militares que poderiam ser fiscalizadas pela CGU.

“Quanto mais esses gastos ficam sujeitos ao controle social, aos órgãos do governo, menores são as chances de haver corrupção. Seria importante que parte das contas das Forças Armadas fosse fiscalizada pela CGU, por exemplo”, afirma Fabiano Angélico.

Outro lado

À reportagem, o secretário de controle interno do Ministério da Defesa, André Sena de Paiva, disse que “nos casos em que são constatados atos ou fatos ilegais ou irregulares, são expedidas recomendações aos dirigentes para que seja efetuada a competente apuração por meio de procedimentos disciplinares e que nas situações em que é identificada a ocorrência de dano ao Erário, é recomendada aplicação de medidas administrativas para ressarcimento do dano”.

Paiva diz ainda que além de apurar as irregularidades constatadas por sua equipe, a Ciset ainda investiga denúncias recebidas pela ouvidoria e atende a diligências determinadas pelo MPF (Ministério Público Federal), MPM (Ministério Público Militar) e a Polícia Federal.

O secretário diz ainda que “as recomendações são objeto de monitoramento da Ciset e as irregularidades são submetidas aos órgãos externos competentes, a exemplo do Tribunal de Contas da União”.

André Sena de Paiva diz que, apesar de sua equipe ser composta por 25 servidores, os Centros de Controle das Forças Armadas, vinculados às Ciset, “conseguem mobilizar efetivos e obter a capilaridade necessária para o trabalho de auditoria nas inúmeras localidades onde existem organizações militares”.

Em nota enviada à reportagem, o Comando da Aeronáutica afirmou que “dispõe de vários instrumentos de controle. Dessa forma, atua diretamente para apurar todas as irregularidades que envolvam seu efetivo e o seu patrimônio. Nesse sentindo, as seguintes ferramentas são utilizadas: sindicância, inquérito policial militar e tomada de contas especial – este último instrumento destina-se a promover o ressarcimento de danos ao erário. Quando a responsabilização é comprovada, a instituição implementa os trâmites necessários para o ressarcimento.”

O Comando da Aeronáutica ainda afirma que “grande parte dos casos investigados pelo Ministério Público Militar e pelo Tribunal de Contas da União são detectados pelas próprias Forças Armadas”.

Uol

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