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Marizópolis: vice rompe e acaba com “governo único” de 22 anos

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publicado em 01/12/2016 às 12h00
atualizado em 01/12/2016 às 09h19

A série de reportagens apresentando fenômenos eleitorais nas eleições municipais deste ano na região Nordeste realizada pelo blog do Magno Martins, de Pernambuco, em parceria com o Portal MaisPB, mostra, nesta quinta-feira (01), Zé de Pedrinho (PSDB), que rompeu e venceu o grupo de José Vieira (PTB), que comandava a cidade de Marizópolis há mais de 20 anos.

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Vice rompe e acaba “Governo único”

MARIZOPÓLIS (PB) – Com apenas 6,2 mil habitantes e 5.106 eleitores, Marizópolis é um dos municípios mais novos da Paraíba, mas também o mais minúsculo territorialmente e mais complicado na vida política. Tem apenas 22 anos, tendo sido emancipado de Sousa em 5 de maio de 1994. Mas desde a sua fundação é governado pelo coronel José Vieira (PTB), uma espécie de tirano. Ao longo do seu reinado, revezou o poder com uma sobrinha, mas envolvido em processos de licitações fraudulentas, foi afastado pela justiça.

Após assumir, o vice Zé de Pedrinho (PSDB), que já havia rompido antes, pôs fim a uma verdadeira dinastia ou governo único, batendo Miguel Neto (PP), sobrinho de Vieira, por uma frente de 467 votos. Teve 2.584 votos (54,97%) contra 2.117 votos (45,03%) do adversário. O tucano elegeu ainda os dois vereadores mais votados, mas não fez a maioria na Câmara para governar: Vieira emplacou cinco dos nove parlamentares.

O segundo mais votado para a Câmara, Carlos Soldado (PMDB), com 417 votos, é um aliado de peso. Foi ele que teve a iniciativa de informar à produção do programa Fantástico que praticamente todas as obras do reinado de Vieira eram produto de licitações viciadas e inacabadas. A cidade é, hoje, campeã em obras que tendem a virar verdadeiros elefantes brancos, porque os recursos destinados e alocados foram desviados.

Marizópolis tem apenas 64 mil km quadrados – em cinco minutos é possível conhecer a cidade, rua por rua – e um turbilhão de problemas. Há dois anos, o repórter secreto do programa Fantástico esteve lá e descobriu uma montanha de dinheiro desviado. O município fez parte do roteiro da reportagem que passou por mais de dez cidades paraibanas, descobrindo bilhões de recursos desviados por uma quadrilha.

A denúncia foi investigada e comprovada pelo Ministério Público. José Vieira acabou preso, condenado por crime de responsabilidade na aplicação de recursos públicos federais em obras sanitárias no município. A condenação foi da Justiça Federal de 1ª instância, em Sousa. Ele ainda tentou recorrer da decisão da condenação, mas o pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, com sede em Recife, foi por unânime e determinou à prisão e também o afastamento imediato da função de prefeito.

O prefeito passou um período preso, mas conseguiu no Supremo Tribunal Federal uma liminar e foi solto. A Justiça ainda decretou a suspensão dos seus direitos políticos por oito anos, perda da função pública e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.

Aliado de Vieira por muito tempo, o prefeito eleito diz que sua vitória vira uma página em Marizópolis. “Acabou o reinado da impunidade, da imoralidade dos maus feitos”, bradou Zé de Pedrinho, tratado pelo coronel como traidor. “Não me considero traidor porque eu expliquei a ele todas as razões do meu rompimento”, rebate. Eleito no exercício do mandato, o tucano está com a diplomação marcada para o próximo dia 13, mas ainda teme que a justiça devolva o poder ao clã que derrotou.

“A justiça ainda não concluiu o processo. Só terei mesmo a garantia de essa gente não volta ao poder a partir de 1 de janeiro com a minha posse”, diz ele. Zé de Pedrinho diz que fez uma campanha barata enfrentando o poderio do rei da cidade, como assim Vieira é lembrado e tratado pela população. Além de enfrentar o poderio econômico, ninguém no município acreditava na sua eleição justamente porque o coronel é especialista em não perder eleição na base na política fisiológica e de cooptação.

“Poucos apostaram na nossa vitória. Fiz uma campanha com os pés no chão, visitando casa por casa”, diz Zé de Pedrinho, para acrescentar: “A descrença da população se justificava pelo fato de Vieira ser um imperador, que reinava desde a criação da cidade. O que se diz por aí é que ele gastou uma fortuna para manter-se no poder na campanha do sobrinho que derrotei”.

O vereador Carlos Soldado passou a ser perseguido por Vieira tão logo a equipe do programa Fantástico exibiu para o País inteiro as falcatruas na gestão municipal. Na véspera da eleição, foi parar na cadeia acusado de porte ilegal de arma, mas ele não teme a truculência do grupo adversário. “Nunca temi e por isso recebi a consagração nas urnas, sendo o segundo mais votado”, afirmou, adiantando que a população espera do prefeito eleito um freio de arrumação. “Marizopólis cansou. Basta de corrupção e impunidade”, afirmou.

MARIZÓPOLIS (PB) – José Vieira da Silva, ou coronel Vieira, como é conhecido, foi eleito prefeito pela primeira vez em 1996, dois anos após a emancipação do município.  Filiado ao PR, teve 73% dos votos derrotando o tucano Dionizio Gomes, que recebeu apenas 979 votos, 26,91% dos votos válidos. Em 2000, foi reeleito, já em outro partido, o PMDB, obtendo 66% dos votos válidos, impondo derrota ao democrata José Leite de Andrade.

Em 2004, na terceira eleição do município, não podendo ser mais candidato por força do impedimento das regras eleitorais, tirou uma candidata do bolso do seu colete e elegeu a sobrinha Alecxiana Vieira Braga, filiada ao PTN. Ela teve 63% dos votos e derrotou o candidato do PRP, Valdemir Gonçalves.

Na eleição seguinte, em 2008, Vieira não permitiu que a sobrinha disputasse a eleição e ele próprio foi o candidato, elegendo-se, desta feita filiado ao PTN, com 74% dos votos, derrotando Bivânia Araújo, do PSB. Em 2012, disputou a reeleição e ganhou novamente, derrotando outro socialista, Abdon Lopes, com 64% dos votos válidos.

Num enredo em que derrota era uma palavra que não constava em sua trajetória política, Vieira tropeçou na escolha de Zé de Pedrinho como vice. A criatura se rebelou contra o criador, rompeu no episódio da sua primeira prisão, registrou sua candidatura já filiado ao PSDB e acabou vitorioso.

“Para felicidade geral da Nação de Marizopólis”, comemora Francisco Quita, pequeno comerciante de estivas na cidade, que votou contra o coronel e pela mudança, cansado, segundo ele, de ver o município nas páginas policiais envolvido em escândalos. Ele se refere a chamada Operação Andaime.

Trata-se da investigação de uma quadrilha suspeita de fraudes em licitações de obras públicas federal, no Sertão paraibano. Os processos envolvendo a operação somam 79 investigações, com 67 réus e 421 delitos em apuração. Entre os 67 réus estão gestores e ex-gestores municipais, a exemplo de José Vieira, de Marizopólis, e os ex-prefeitos de Cajazeiras, Carlos Rafael Medeiros de Souza; de Monte Horebe, Erivan Dias Guarita; e de Bernardino Batista, José Edomarques Gomes; da prefeita de Monte Horebe, Claudia Aparecida Dias, e o marido dela; além de servidores públicos; empresários, como Mário Messias Filho, Afrânio Gondin Júnior, Manoel Cirilo Sobrinho e Enólla Kay Cirilo Dantas, além de engenheiros de obras, como Wendell Alves Dantas, Márcio Braga de Oliveira e Jorge Luiz Lopes dos Santos.

De acordo com o processo, os colaboradores de investigação na operação estão sendo Francisco Justino do Nascimento, considerado “o operacionalizador supra municipal do esquema”, responsável por “vender os serviços ilícitos de suas empresas ‘fantasmas’ aos núcleos municipais”, fez acordo de colaboração premiada e está em liberdade condicional. Além de Justino, já foram celebrados outros sete acordos de colaboração premiada, totalizando oito, todos homologados pelas Justiças federal e estadual.

HISTORIA
Os primeiros conquistadores do município foram os irmãos Ledo, no ano de 1723. Logo após, houve o incentivo à lavoura, à criação e ao povoamento. Tudo isso se deu à fertilidade do solo, que passou a despertar interesse de pessoas de lugares mais remotos da região. Isso se deu no ano de 1730. Fundada pela família do Governador Antonio Mariz, teve o seu nome, antes Pedra Talhada, alterado para Marizópolis, como forma de homenagear a família Mariz. É também conhecida como a Mesopotâmia do Sertão por ser situada entre os Rios do Peixe e Piranhas.

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