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Professor de História pela UFPB e analista político

Cida Ramos e Nonato Bandeira

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publicado em 08/06/2016 às 11h12
atualizado em 08/06/2016 às 11h38
Cida Ramos pode ter cometido o primeiro erro, cujo alcance ainda será medido, desde que assumiu a condição de candidata: a indicação de Nonato Bandeira para a coordenação política de sua campanha. 
Ninguém discute aqui as qualidades de Nonato Bandeira, um quadro raro da política paraibana. A questão tem a ver com os resultados práticos dessa indicação no discurso da candidata Cida e nos rumos da campanha da socialista. E eles hoje parecem insofismáveis. 
Por exemplo: não poder ser considerado obra do acaso o afastamento de Cida Ramos de sua recente trajetória de crítica feroz do que ela chamava de “golpe” e de defensora do mandata de Dilma Rousseff. 
O engajamento de Cida era tal que ela chegou mesmo a criticar o prefeito Luciano Cartaxo quando o mesmo anunciou sua posição.
“Eu sou contra o golpe, e tenho me posicionado, tenho ido às ruas, e, sinceramente, não vejo Luciano se posicionando. Mas, eu quero muito encontrá-lo nas ruas, nas manifestações, porque não basta a pessoa dizer, a pessoa que tem um cargo público precisa assumir posições”, disse ela, não faz nem dois meses. 
 
Hoje, Cida foge de Dilma como o diabo foge da cruz. Chegou mesmo a anunciar viagem, em plena campanha, para outros estados exatamente na data em que a presidenta afastada visitará a Paraíba.
 
Não que eu pense que o certo seria ela vincular sua campanha à imagem de Dilma Rousseff e exclusivamente à luta pela volta da ex-presidenta. Claro que não. 
 
Mas, ao procurar se afastar de Dilma como se nada tivesse a ver com a luta para mantê-la na Presidência pode ser lido negativamente pelo eleitorado – o inconveniente de se perguntar sobre isso é revelado em entrevista que a candidata concedeu ao programa de Heron Cid, na rádio Arapuan, quando Cida Ramos tentou definir a maneira como o repórter deveria pergunta-la.
 
E isso, mais uma vez, não é obra do acaso. 
 
Também não faz pouco tempo, Bandeira estava na trincheira oposta a de Cida Ramos quando o assunto era impeachment – aliás, isso acontecia desde 2012,  quando Nonato rompeu com RC para apoiar Luciano Cartaxo e, em 2014, rompeu com os dois para apoiar Cássio Cunha Lima. 
 
Em entrevistas, a virulência dos ataques de Nonato a Dilma era uma marca do discurso do presidente estadual do partido de Roberto Freire, o PPS, na Paraíba.
 
Em artigo publicado há exatos dois meses no blog do Gordinho, intitulado “Dilma, o poder e o exemplo de Einstein” – Reynaldo Azevedo, o jornalista da nova direita fez um exercício semelhante em seu blog na Veja com o título “Foi Einstein quem definiu direito a loucura de Dilma”, − Nonato Bandeira defende o afastamento de Dilma de maneira enfática e distribui ataques àqueles que eram contrários ao impeachment.
 
Entre outras coisas, Bandeira escreveu:
 
“Se o PT continuar no poder, depois de 14 anos, a corrupção poderia ser institucionalizada nos trópicos.”
 
“O aparelhamento do Estado será rotina na administração federal se este Governo continuar.” 
 
“Quando se aproximar o fim do ano e as contas públicas não fecharem é urgente burlar a tal Lei de Responsabilidade Fiscal, a mesma que certo partido combateu em passado recente.” 
 
“O atual Governo permanecendo será prática comum a obstrução da justiça”
 
“Continuando o PT no poder, sempre teremos o argumento de que o povo saiu da miséria e tem um prato de comida na mesa, quando sabemos que aumentou o número de beneficiários do bolsa família porque a pobreza também aumentou, além do poder de compra do salário mínimo estar corroído pela inflação.”
 
“Nossas estatais podem ser sucateadas, como os Correios e a Petrobras, dois orgulhos nacionais.” 
 
“Demite-se um ministro da Justiça que não controla as ações da Polícia Federal, quando ela deixar de atender às exigências do Governo.” 
 
“A presidente Dilma deve deixar o cargo pelo conjunto da obra.” 
 
É preciso dizer mais alguma coisa?
 
Um erro?
 
São vários os acontecimentos interligados que parecem indicar que, em 2016, o Brasil pode viver uma onda de rejeição a personalidades políticas, partidos e candidatos que patrocinaram, apoiaram, votaram pelo impeachment da presidenta Dilma e, por fim, compuseram os quadros do governo provisório de Michel Temer. Como o PPS.
 
1. De forma surpreendente, Cássio Cunha Lima foi vaiado na abertura do Maior São João do Mundo, e, com aquele engajamento, pela primeira vez, naquela que um dia foi sua fortaleza inexpugnável, Campina Grande. Quem prestou atenção no vídeo deve ter notado que as vaias se intensificam quando Cássio menciona que o governo Dilma é o mais “corrupto da história”.
 
2. De repente, sem que haja nada que justifique, a não ser o momento político, a plateia que assistia no último final de semana ao show de Ney Matogrosso, no Rio, passa a entoar entre uma música e outra um “fora Temer” generalizado; o mesmo já havia ocorrido em show de Carlinhos Brow, na Bahia, e até durante peça de teatro, em Belo Horizonte. Ney pode ser considerado um anti-petista.
 
3. Atores brasileiros que participavam do Festival de Cannes, entre eles, Sônia Braga, postam-se diante das câmeras da imprensa mundial segurando cartazes que denunciavam que no Brasil estava acontecendo um “golpe”. E as imagens correm o mundo.
 
4. O ator Guilherme Weber, em suas despedidas finais de entrevista concedida ao Programa do Jô, da Rede Globo (REDE GLOBO), aproveita para também dar o seu recado: “fora Temer”. E é ovacionado pela plateia.
 
Eu poderia mencionar tantos outros fatos, como as mobilizações de rua que só crescem a cada dia, especialmente aquelas que contam com a presença de Dilma Rousseff, como as últimas em Belo Horizonte e Porto Alegrem, mas eu vou ficar nos exemplos apontados acima porque tem um grau de envolvimento maior que vai além daqueles que são engajados politicamente.
 
É claro que alguém tomou a iniciativa de vaiar ou fazer seu protesto, mas esse não é o dado a ser destacado. Cássio sempre recebeu vaias de seus adversários em Campina, mas nunca chegou a respondê-los diretamente, como fez, sentindo o golpe e a adesão massiva. 
 
O importante foi esse engajamento em torno de uma bandeira política, que vai muito além da defesa do mandato de Dilma ou do PT. 
 
Talvez seja esse aspecto que escape a muitos analistas ou políticos experientes: o amadurecimento político da sociedade, a rejeição, entre outras coisas, às práticas do tradicionalismo político. 
 
E nenhum partido representa tão bem como o PMDB, que reúne agora em torno do governo de Michel Temer seus velhos aliados (PPS, Dem e PSDB), que apenas mostram que de renovadores na política não tem nada. Pelo contrário.
 
Por isso, o PSB poder ter cometido um erro ao indicar Nonato Bandeira para posição de tanta relevância. E deixado, na prática, sua candidata seguir essa linha.
 
Charliton Machado comemora. Cartaxo também.

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